quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Museu Etnográfico Crisanto Jobim

Instituto Geográfico Histórico do Amazonas
Eu e minha amiga Anália Ferreira Silva fomos visitar o Instituto Geográfico Histórico do Amazonas (IGHA) semana retrasada. Quem nos apresentou tudo, além de nos ajudar a pesquisar os documentos de seu arquivo, foi nossa amiga Olga Almeida. Ela estava com dor na garganta e pedimos para ela nos apresentar o IGHA. Sim, abusamos da coitadinha. Fiquei com pena dela, tamanho era o esforço para falar, mas depois passou (a minha pena, não a falta de voz dela, claro).
Não vou falar de toda a visita e nem do arquivo hoje, por causa da falta de tempo. Falarei aqui somente do Museu Crisanto Jobim que fica nos fundos do IGHA. Em primeiro lugar, quem foi Crisanto Jobim (1879-1940)?
Desenho que fiz da foto de Crisanto Jobim do livro Manaus, Entre o Passado e o Presente (1999) de Durango Duarte.

Pesquisei e descobri umas coisinhas sobre ele: Crisanto Maria de Souza Moreira Jobim nasceu em Anadia, uma pequena cidade de Alagoas e começou sua carreira em Maceió como guarda de alfândega. Chega em Manaus para assumir o posto de escriturário da Delegacia Fiscal do Amazonas em 1915. Ocupou cargos importantes como a Secretartia da Prefeitura de Moura (hoje parte dos municípios de Barcelos e Coari) e a Secretaria Geral do Estado logo após a rebelião tenentista de 1924.
Por formação, Crisanto era engenheiro agronômo, mas possuía um grande interesse pelos povos indígenas. Passou a estudar Etnografia e Arqueologia. Chegou até a fundar um instituto antropológico chamado de Colégio Martius (homenagem ao naturalista alemão que passou pela Amazônia no século XIX).
Crisanto tentou construir uma espécie de coleção de objetos e material etnográfico. Nomeou sua coleção de Museu Rondon. Não se sabe muito bem quando ele começou a funcionar. Já na década de 1926, o IGHA manifesta interesse em comprar o acervo do pesquisador. Com os cinco conto de réis fornecidos pela Câmara Federal como auxílio para o IGHA, a instituição finalmente o compra em 1934. O museu só foi ser reorganizado em 1976, com a ajuda da Fundação Joaquim Nabuco e da Universidade do Amazonas. Mesmo assim nem todo o acervo foi catalogado. Em 1982, em homenagem á Crisanto a diretoria do IGHA nomeia o acervo com o seu nome.
Museu Etnográfico Crisanto Jobim. Foto de Olga Almeida.
Vamos ao Museu em si: ele está localizado nos fundos do IGHA e ocupa três salas. Logo na primeira temos uma maquete do que seria a Vila da Barra (atual Manaus) nos tempos da colônia. Como era de se esperar, lá está o Forte de São José do Rio Negro. Pode se ver os caboclos secando a carne do pirarucu, os soldados andando pela vila, as casas de taipa ao fundo. Enfim, se fosse falar dos detalhes ficaria aqui o dia inteiro. Basta dizer que é muito curioso. A maquete foi construída por Alfredo Loureiro e funcionários dos Laboratórios Reunidos.
Ao redor vemos as lanças, arpões, arcos e flechas indígenas. O mais interessante é uma pedra de quartzo meio oval a qual os Dessana acreditavam ser a avó do Universo. Na sala ao lado estão as urnas funerárias. Desde as menores até os fragmentos das gigantescas. Junto com elas, amoladores primitivos e pedras lascadas.


A terceira sala se desvia um pouco da temática indígena: lá estão vários retratos autografados de celebridades (Churchill, Álvaro Maia, Virgínia Lane, etc), algumas fotos da Manaus antiga e inúmeros animais empalhados. Um armário gigantesco, cheio de compartimentos onde podemos ver couros de sucuris, crânios de jacarés, ovos de pássaros e os próprios pássaros empalhados, divide a sala com a parede de quadros. Essa parte lembra muito os velhos gabinetes de ciências dos naturalistas, onde se guardavam as mais variadas espécies de plantas e animais. Claro que os objetos e animais empalhados aqui servem mais como curiosidade e enfeite do que artefatos científicos. E quanto aos quadros, tenho quase certeza que eles pertencem ao acervo do IGHA e não propriamente do Museu Rondon. São interessantes porque, juntos, parecem uma espécie de relicário de uma Manaus que não era mais a da Belle Epóque, mas pretendia ser cosmopolita ainda.

Enfim, o Museu Crisanto Jobim é muito interessante. Andar por ele pode ser divertido, aprendemos algumas curiosidades, mas para o pesquisador, professor ou mero interessado em História ele é um prato cheio para se falar de uma época em que a Antropologia dava seus primeiros passos no Brasil e na Amazônia. Lá vemos aquele que era considerado o objeto de estudo por excelência (o universo indígena) da Antropologia de então e um pouco do contexto de seus "pesquisadores" - homens que tinham profissões tradicionais e origens sociais abastadas, mas que pela curiosidade de se compreender uma cultura vista como "exótica" começaram a dar os primeiros passos da etnografia na região. Homens como Crisanto Jobim.

terça-feira, 30 de agosto de 2011

História vista de baixo: problemas

Coleção Povo de Lisboa do Arquivo de Manuel Gondinho.
Sharpe lembra que a História Vista de Baixo se iniciou com a ajuda do marxismo e da história social britânica (Thompson é um bom representante de ambos). No segundo momento, os historiadores dos Annales entraram na roda. As contribuições, no entanto, também trouxeram limitações.
A análise marxista se focava no período pré-industrialização, quando o capitalismo dava seus primeiros passos para sua consolidação. A pergunta colocada pelo autor do artigo é: como fazer História Vista de Baixo nos séculos anteriores ao da Revolução Industrial? Hobsbwam dizia que a Revolução Francesa, com a criação de seus arquivos sobre o cotidiano das pessoas, era um divisor de águas no quesito documentação. Nova pergunta então: como fazer História Vista de Baixo antes da Revolução Francesa.
Montaillou, de um membro da História Nova, é uma tentativa de responder essa pergunta. Afinal, estamos em uma aldeia francesa no início do século XVIII. Como foi possível construir esse estudo? Como dissemos antes, LeRoy Ladurie usou de documentos da Inquisição. A contribuição da História Nova pode ser encarada como um maior diálogo com a sociologia e a antropologia, um campo maior de fontes (incluindo aqui a história oral, por exemplo) e uma conceituação nova: as mentalidades.
Mentalidades é difícil de definir, mas pode ser encarada como o conjunto de elementos simbólicos que guiam as ações e os comportamentos de uma determinada sociedade. O conceito sofreu críticas por sua imprecisão e sua abrangência. O comandante da tropa e o soldado raso que escreve á esposa tem a mesma mentalidade? E a sua diferença social não interfere nisso?
Na História Vista de Baixo também foi criticada sua imprecisão. O que seria esse "de baixo"? Dentro do povo existem os mais variados grupos sociais e culturas, então chamar o estudo do povo de História Vista de Baixo não é uma generalização grotesca? Afinal, o "baixo" pode ser relativo: o capitão comparado ao comandante da tropa é de "baixo", assim como o soldado raso é mais "baixo" ainda se comparado ao capitão do batalhão. Alguns críticos acreditam que essa imprecisão é fruto do panfletismo, da defesa apaixonada das massas que acaba reduzindo-as á um termo que não dá conta de todo o seu tamanho.
Quanto á essa questão, além da necessidade de melhor questionamento e detalhamento, impõe-se sempre enxergar a História num âmbito total. Ou seja, a História Vista de Baixo não tem sentido se for tomada como um fim em si mesma, afinal o que é do "baixo" sem o de "cima"? Por isso, não podemos deixar de considerar as outras esferas da História.
Outro problema, esse menos teórico, decorre do insucesso da História Vista de Baixo fora da academia. Ora, a História Vista de Baixo tem um forte cárater social e político, afinal ela está reagindo á História oficial, a história das elites. Nada mais sensato que endereçá-la, além da academia, ao povo, á sociedade em geral. No entanto, os estudos mais tradicionais são os mais lidos fora das universidades. Será culpa da continuação daquela idéia de que a verdadeira história é a dos grandes feitos e dos grandes homens? Ou o historiador também tem culpa ao escrever teses com muitos conceitos teóricos e uma linguagem muito técnica que acaba afastando o povo? Corremos o risco de fazer uma História Vista de Baixo para quem está em "cima", então?

sábado, 27 de agosto de 2011

A Dor da Saudade

Hoje senti saudade de Taubaté e do Vale do Paraíba. Senti saudade também de pessoas que não estão mais entre nós. E quando se fala em saudade na mesma hora me vêem a nostálgica música do compositor  de São Luiz do Paraitinga, Elpídio dos Santos (1909-1970), que se tornou conhecida graças aos filmes de Mazzaropi: A Dor da Saudade.

A dor da saudade
Quem é que não tem
Olhando o passado
Quem é que não sente
Saudade de alguém...

Da pequena casinha
Da luz do luar...
Do vento manhoso
Soprando do mar...

A dor da saudade...

E até das mentiras
Que fazem sonhar
De alguém que se foi
Pra não mais voltar...

A dor da saudade...

Vá embora saudade
Dá minha casinha
Que eu quero bem



Aí embaixo, a música na voz de Suzana Sales e Lenine Santos:


Elpídio dos Santos
E aqui, a versão clássica de Mazzaropi:

Dalí contra a arte moderna

Os críticos da velha arte moderna foram sobretudo enganados e corneados pelo "moderno" mesmo. De fato, nada envelheceu mais depressa e pior do que aquilo tudo que num momento qualificaram de "moderno".

(...)

Pintor, não te ocupes
em ser moderno.
É a única coisa que,
infelizmente,
não importa o que fizeres
não poderás evitar de ser.

Salvador Dalí, pintor catalão em Libelo contra a Arte Moderna (1956).

História vista de Baixo: obras

Indivíduos I de Maria Burgaz.
O historiador britânico Jim Sharpe inicia seu artigo sobre a História Vista de Baixo lembrando da importância da Batalha de Waterloo, a derrota de Napoleão Bonaparte para a Inglaterra. Fazer História Vista de Baixo não é menosprezar a importância desse acontecimento, mas abordá-lo de uma outra forma. por exemplo, usando as cartas de um jovem soldado raso á sua amada. Cartas onde ele registra o cotidiano dos batalhões ingleses, a região em que está acampado e a própria batalha.
Bertold Brecht, poeta alemão, já se perguntava onde estão na História os responsáveis por construir as pirâmides. Só se ouve falar em quem comandou sua construção e não em quem participou dela efetivamente. É o caso do nosso soldado raso. Seu nome era desconhecido até Sharpe usá-lo como exemplo para abrir esse artigo.
O primeiro estudo de História Vista de Baixo, segundo o autor, vem de Edward Thompson com seu artigo History from Below (História vista de baixo) para uma revista britânica em 1966. Ali ele propõe que se faça uma história da classe trabalhadora inglesa que fale dos líderes e das organizações trabalhistas, mas não só delas. Fazer uma história que aborde também o trabalhador não engajado, afinal ele também é um trabalhador e faz parte dessa classe.
Na década de 1970, o estudo do historiador francês Emmanuel LeRoy Ladurie sobre denúncias de bruxaria numa pequena vila do Norte da França gerou um best-seller: Montaillou (o nome da tal vila). Por meio de processos da inquisição, ele pode ver como os seus moradores viviam e como reagiam á tais acusações.
Na mesma década surgiria outro estudo de História Vista de Baixo que se tornaria um best-seller: O Queijo e os Vermes de Carlo Ginzburg. Um moleiro italiano que tem suas próprias idéias sobre a criação do mundo é investigado pela Inquisição e através desse caso curioso, Ginzburg demonstra como era a cultura na Itália Moderna.
Há ainda muitos trabalhos, mas esses três são os fundamentais quando se fala em História Vista de Baixo. Eles demonstram como a história oficial esconde preciosidades como essas. Ladurie e Ginzburg trabalharam com documentos oficiais, processos da inquisição, e através de uma boa crítica - uma leitura á contrapelo- conseguem achar grupos sociais que foram escondidos pelo discurso oficial. Thompson utilizará num livro posterior (A Formação da Classe Trabalhadora Inglesa) vários tipos de fontes, sejam das organizações trabalhistas ou do próprio governo.

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Hobsbawm na berlinda

Eric Hobsbawm
O historiador britânico Tony Judt, conhecido por seus estudos de historiografia e sobre História Contemporânea, lançou há um tempo um livro onde estavam artigos sobre história e historiadores. O nome do livro é O Século XX Esquecido. Li apenas um artigo desse livro, o que falava sobre Eric Hobsbawm.
Hobsbawm é conhecido como um dos historiadores marxistas britânicos mais famosos mundialmente. Seus livros sobre "as eras" fizeram sucesso fora da Inglaterra e seus trabalhos sobre identidade nacional, a classe trabalhadora e o marxismo também se tornaram antológicos.
Hobsbawm é tido como um dos mais famosos neo-marxistas, ou seja, intelectuais que fizeram uma revisão sobre o comunismo enquanto política e teoria filosófica e historiográfica. Existe uma corrente do marxismo que surgiu justamente após os anos 50 chamada de Eurocomunismo que retira a violência de uma ditadura do proletariado e inclui em seus projetos a democracia e o pacifismo. Hobsbwam, politicamente, é tido como eurocomunista.
Judt inicia o artigo falando isso tudo e muito mais. Lembrando dos méritos impressionantes de Hobsbawm (sua trajetória, sua erudição, seu poder de análise e sua fama). Depois parte para uma crítica que pouca gente teria coragem de fazer. O autor tenta entender como Hobsbwam pode continuar filiado ao comunismo, sem nenhuma crise de consciência após as denúncias dos horrores do stalinismo e da queda do Muro de Berlim.Ora, existem muitos intelectuais que são comunistas hoje. O comunismo não é uma peça de museu ainda. Acabamos de falar á pouco de como ele se modificou e se faz presente hoje. Judt está falando daquele comunismo ortodoxo, meio dogmático. Para ele, Hobsbawm, embora seja considerado um dos expoentes do neo-marxismo, ainda conservava traços dele.
O historiador britânico seria, portanto, um homem mais apegado ás idéias que ao povo propriamente dito. A maior prova disso seria sua escrita altamente erudita e sua posição altamente acadêmica. Hobsbawm, ao contrário de Thompson, fala para os acadêmicos. Se apegaria mais á teorias que á sentimentos. Tanto que em nome da luta de classes, segundo Judt, transformaria bandidos em heróis populares em um estudo feito anos atrás - uma atitude que lembra muito as ações do marxismo ortodoxo, dos anos do stalinismo.
Tony Judt
Tony Judt é um historiador um tanto polêmico. Polêmico porque faz observações ácidas sobre a historiografia inglesa e internacional. Essas observações carregam, na maioria, um pouco de sua posição política (de direita), mas também não deixam de estar amarradas á algumas meias-verdades. Quando chama Hobsbawm de mandarim comunista, por exemplo, está cutucando tanto os historiadores neo-marxistas como o eurocomunismo. Mas tenho de concordar com ele em alguns aspectos, como o afastamento do historiador britânico de um público mais amplo. Hobsbawm tem uma linguagem que utiliza muitos termos técnicos e muita erudição, o que faz com que a maioria de seus livros (excetuando-se talvez A Era dos Extremos, onde, por conta do tema mais atual, ele se faz mais dinâmico) sejam criados quase que exclusivamente para acadêmicos. Aqui, no entanto, cabe relativizar um pouco: afinal, Hobsbawm escreve para o leitor inglês. Qual o nível de instrução do leitor inglês comum? Ele é compatível com a erudição do historiador? Se não for, acredito que isso não deve diminuir em nada o respeito que devemos ter por Hobsbawm, afinal suas contribuições á historiografia são enormes. É até interessante, porque isso nos lembra que esse grande historiador também é humano.

terça-feira, 23 de agosto de 2011

Um resumo provisório

Abaixo está um resumo sobre o artigo História dos Intelectuais na Década de Cinquenta de Leandro Konder. Um resumo muito breve. Prometo que farei outro mais coerente e crítico.


Leandro Konder em artigo para o livro Historiografia Brasileira em Perspectiva, organizado por Marcos Cézar Freitas, aborda como os intelectuais brasileiros da década de 1950 interpretavam a História e sua época.
Primeiro lembra o clima da época: o painel não era nada animador nos primeiros anos, mas no final da década tudo tinha mudado trazendo grandes expectativas. O medo de uma terceira guerra mundial tinha se dissipado com a "coexistência pacífica", acordo velado entre EUA e URSS. O conservador papa Pio XII tinha dado lugar ao papa João XXIII que criou medidas que influenciariam a Teologia da Libertação. O estranhamento com o biquini passou e agora ele era mania nacional. Tudo tinha mudado.
Os intelectuais enxergaram isso. Eles viram o Brasil e o mundo mudar. Cada um reagiu como forma sua origem social e sua posição ideológica. Os conservadores se assustavam com o rumo dos acontecimentos, já os marxistas se dividiam entre apreensão e o entusiasmo.
Uma corrente ideológica muito importante nascida nessa década foi o nacional-desenvolvimentismo. Konder credita á Hélio Jaguaribe seu surgimento. Jaguaribe pretendia entender porque o Brasil estava na fossa e propor então medidas para tirá-lo de lá. Por isso foi buscar na nossa História as razões de nosso subdesenvolvimento. Chegou á conclusão de que por nunca sofrermos nenhuma crise, nunca refletimos profundamente sobre nosso país e assim as mesmas medidas tomadas pela elite dirigente na colonização continuam sendo tomadas.
Os conservadores procuravam na História exemplos para guiar o povo no presente. Seja em grandes homens ou nos seus gloriosos atos. Quando não o faziam desmereciam o peso das mudanças históricas ou da crítica historiográfica, duas teclas em que os marxistas sempre batiam.
Konder dá mais destaque aos marxistas - afinal, ele é marxista e vivenciou esse período entre essa corrente de pensamento. Aqui ele fala de como o marxismo da época era dogmático e totalmente confuso, por causa de seu culto á figura de Stálin. Existiam, contudo, exceções como Caio Prado Júnior.
Por causa desse clima de "sociedade secreta", muitos intelectuais decidiram não se filiar ao partido. Outros queriam apenas conhecer melhor a teoria de Marx para depois se decidirem se o seguiriam ou não. É o que costumava acontecer nos grupos de estudo das universidades (Florestan Fernandes e Arthur Gianotti fizeram isso).
A morte de Stálin e as denúncias das atrocidades por ele cometidas (feitas por seu sucessor, Nikita Kruschev) pediram uma reformulação do marxismo que vinha sendo feito até então. Após reconhecerem o erro que cometeram, os "marxistas-leninistas" (como chama Konder) decidiram se aprofundar mais na teoria do filósofo alemão e na realidade brasileira.
Resumindo: os intelectuais na década de 1950 tinham inquietações suscitadas pelas mudanças que vinham observando. Essas inquietações os levaram a pesquisar nosso passado e o presente. As discussões e pesquisas se consolidariam e se radicalizariam na década seguinte. A década de 50 preparao terreno para o campo intelectual ousado e conflitivo da década de 60.

Mea Culpa ou nossa culpa?



Já faz um tempo que Amanda Gurgel, uma professora potiguar, fez um longo discurso atacando os políticos por  considerarem o professor o único responsável pela situação caótica da educação brasileira. Pois bem, coisa de dois dias atrás o governador do Ceará, Cid Gomes, disse: "Quem quer dar aula faz isso por gosto, e não pelo salário. Se quer ganhar melhor, pede demissão e vai para o ensino privado."
Ontem, na aula de Teoria e Prática do Ensino de História, ministrada pelo Prof. Tarcísio Serpa Normando falávamos justamente disso. Da idéia enraizada em nossa mentalidade do magistério enquanto sacerdócio. O professor tem a vocação para ensinar. Na sala de aula ele é o próprio saber, ele coloca na cabeça dos alunos todo o conhecimento.
De onde vem essa imagem? Levantamos algumas hipóteses: talvez a origem de nossa educação (afinal, os jesuítas dominaram a educação no Brasil por anos a fio) ou mesmo uma distorção do iluminismo (enxergando a Razão como uma entidade quase divina e o professor e o filósofo como os responsáveis por levá-la ás classes populares).
De qualquer maneira, o fato é que essa mentalidade tem mais culpa no cartório que o professor, pois ela justifica uma posição autoritária na sala de aula e falta de política educacionais que ajudem o professor nos órgãos responsáveis. O professor que se encara como um xamã não dialoga com seu aluno e assim vai se abrindo um fosso entre ele e sua turma. O político que encara o professor como sacerdote acredita que por ele estar servindo á uma causa maior não merece ter um bom salário, afinal o dinheiro corromperia sua "missão".
É claro que existem professores não comprometidos com a educação (e muitos), mas Cid Gomes apenas está procurando uma justificativa para os pequenos recursos destinados (ou desviados) á educação. E ao dizer isso se iguala á tantos políticos pelo nosso país. A culpa nunca é deles, mas dos professores. Muitos pais também acreditam que a culpa de seus filhos não aprenderem direito e não se comportarem seja do professor também. O que é um absurdo: a educação, como já falamos aqui antes, vai além dos muros da escola, ela está nas ruas e nas casas. E o sistema educacional é muito complexo que precisa que todas suas partes ajam conjugadas, o que não é o que acontece. Logo a culpa cai sempre sobre o elo mais fraco da corrente: o professor.
É muito fácil se desligar da responsabilidade de educar, Cid Gomes demonstra isso muito bem. Enquanto não houver professores comprometidos, pais comprometidos e políticos comprometidos com a educação o que podemos esperar?

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

José Cândido de Carvalho

Realejo, Djanira.
Vou colocar aqui alguns dos pequenos e engraçados contos do escritor carioca José Cândido de Carvalho (1914-1989), um dos meus favoritos.




Adeus tardes fagueiras à sombra das laranjeiras
de Casemiro de Abreu


Alcimaco Azambuja, dono de muito boi e muito voto em Pirapora, tendo de resolver umas coisas e loisas com o governo, rebocou Zizinho Pinto para terras e mares do Rio de Janeiro. E, na porta do Palácio do Catete, que naqueles dias comandava a vida do Brasil, falou para o compadre Zizinho:

— Vou ver uns papéis que estão entalados nas gavetas do governo. Venha comigo.

Zizinho recusou:

— Compadre, careço de competência para pisar chão tão mimoso. Vou quedar do lado de fora, assuntando compadre.

O compadre sumiu pela larga porta de entrada enquanto Zizinho, instalado num bom cigarro de palha, ficava vendo aquele entrar e sair de gente em formato de formiga de correição. Alcimaco, depois de desencravar seus papéis, voltou e quis saber a opinião de Zizinho Pinto:

— Compadre, gostou do Catete? Coisa assim não tem em Pirapora.

E Zizinho de Pirapora:

— Eta, compadre, lugarzinho bom de especial para um varejo, para um comercinho de cachaça e rapadura!

E mais não disse nem lhe foi perguntado.

Porque Lulu Bergantim
não atravessou o Rubicon


Lulu Bergantim veio de longe, fez dois discursos, explicou por que não atravessou o Rubicon, coisa que ninguém entendeu, expediu dois socos na Tomada da Bastilha, o que também ninguém entendeu, entrou na política e foi eleito na ponta dos votos de Curralzinho Novo. No dia da posse, depois dos dobrados da Banda Carlos Gomes e dos versos atirados no rosto de Lulu Bergantim pela professora Andrelina Tupinambá, o novo prefeito de Curralzinho sacou do paletó na vista de todo mundo, arregaçou as mangas e disse:

— Já falaram, já comeram biscoitinhos de araruta e licor de jenipapo. Agora é trabalhar!

E sem mais aquela, atravessou a sala da posse, ganhou a porta e caiu de enxada nos matos que infestavam a Rua do Cais. O povo, de boca aberta, não lembrava em cem anos de ter acontecido um prefeito desse porte. Cajuca Viana, presidente da Câmara de Vereadores, para não ficar por baixo, pegou também no instrumento e foi concorrer com Lulu Bergantim nos trabalhos de limpeza. Com pouco mais, toda a cidade de Curralzinho estava no pau da enxada. Era um enxadar de possessos! Até a professora Andrelina Tupinambá, de óculos, entrou no serviço de faxina. E assim, de limpeza em limpeza, as ruas de Curralzinho ficaram novinhas em folha, saltando na ponta das pedras. E uma tarde, de brocha na mão, Lulu caiu em trabalho de caiação. Era assobiando "O teu-cabelo-não-nega, mulata, porque-és-mulata-na-cor" que o ilustre sujeito público comandava as brochas de sua jurisdição. Lambuzada de cal, Curralzinho pulava nos sapatos, branquinha mais que asa de anjo. E de melhoria em melhoria, a cidade foi andando na frente dos safanões de Lulu Bergantim. Às vezes, na sacada do casarão da prefeitura, Lulu ameaçava:

— Ou vai ou racha!

E uma noite, trepado no coreto da Praça das Acácias, gritou:

— Agora a gente vai fazer serviço de tatu!

O povo todo, uma picareta só, começou a esburacar ruas e becos de modo a deixar passar encanamento de água. Em um quarto de ano Curralzinho já gozava, como dizia cheio de vírgulas e crases o Sentinela Municipal do "salutar benefício do chamado precioso líquido". Por força de uma proposta de Cazuza Militão, dentista prático e grão-mestre da Loja Maçônica José Bonifácio, fizeram correr o pires da subscrição de modo a montar Lulu Bergantim em forma de estátua, na Praça das Acácias. E andava o bronze no meio do trabalho de fundição quando Lulu Bergantim, de repente, resolveu deixar o ofício de prefeito. Correu todo mundo com pedidos e apelações. O promotor público Belinho Santos fez discurso. E discurso fez, com a faixa de provedor-mor da Santa Casa no peito, o Major Penelão de Aguiar. E Lulu firme:

— Não abro mão! Vou embora para Ponte Nova. Já remeti telegrama avisativo de minha chegada.

Em verdade Lulu Bergantim não foi por conta própria. Vieram buscar Lulu em viagem especial, uma vez que era fugido do Hospício Santa Isabel de Inhangapi de Lavras. Na despedida de Lulu Bergantim pingava tristeza dos olhos e dos telhados de Curralzinho Novo. E ao dobrar a última rua da cidade, estendeu o braço e afirmou:

— Por essas e por outras é que não atravessei o Rubicon!

Lulu foi embora embarcado em nunca-mais. Sua estátua ficou no melhor pedestal da Praça das Acácias. Lulu em mangas de camisa, de enxada na mão. Para sempre, Lulu Bergantim.

Conceitos II

O que são conceitos? São ferramentas que nos ajudam a entender a realidade. Foi na Grécia Antiga que Sócrates definiu o que seriam conceitos. Os conceitos seriam palavras abstratas que nos ajudariam a entender o mundo concreto. A filosofia falaria á respeito de conceitos e não de opiniões.O conceito, por ser abstrato, nunca será fielmente o que pretende explicar. Ele é apenas uma representação, uma espécie de palavra-chave.
Da Grécia até hoje muitos conceitos foram criados, na filosofia e fora dela. Em história, por exemplo, qualquer trabalho científico deve vir acompanhado, logo no início, do referencial teórico, ou seja, os conceitos que o pesquisador usará.
Muitos acreditam que a história só se renovará quando se renovarem seus conceitos. Michel de Certeau acredita que não são os conceitos que irão renovar a história e as demais ciências, mas a própria sociedade. Para o historiador francês, as ciências estão mais do que ligadas nas relações sociais e seus conflitos, por isso quando mudanças significativas acontecem na sociedade elas se renovam.
Ele dá alguns exemplos: no tempo do entreguerras, principalmente durante a crise de 1929, a história voltou-se para a economia e formou vários conceitos como fase de expansão e retração. Enquanto que nas últimas décadas a globalização e a indústria cultural tem ajudado os pesquisadores a elegerem como o conceito mais importante desse começo de milênio a cultura.

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Conceitos

O historiador lida com conceitos. Para interpretar a realidade ele deve sempre se munir de conceitos. Conceitos que o ajude a entender um personagem, decifrar um momento ou compreender um processo. O mundo dos conceitos, porém, é muito vasto.
Carlo Ginzburg no seu livro Andarilhos do Bem (1966) usa o conceito mentalidades para explicar como as práticas culturais de camponenses de uma certa região da Itália confundidas pela Inquisição com bruxaria eram na realidade resquícios de uma cultura oral, pagá e rural. No entanto, no seu livro mais famoso, O Queijo e os Vermes (1976), elege como conceito maior a circularidade de idéias para explicar como um moleiro pode ter tantos argumentos para a criação do mundo diante do tribunal da Inquisição. Desde então Ginzburg tem renegado o conceito de mentalidades e defendido a circularidade de idéias. Por quê?
Definir mentalidades é complicado, mas vamos tentar: tudo aquilo que uma civilização pensa e se manifesta em práticas culturais pode ser entendido como uma mentalidade. A mentalidade é a permanência, afinal ela muda muito pouco com o decorrer do tempo.
Circularidade de idéias significa, por sua vez, um intercâmbio entre a cultura erudita e a cultura popular. Afinal, as classes possuem culturas próprias, mas nada impede que algumas práticas culturais sejam apropriadas por outra e resignificadas.
Ginzburg acredita que mentalidades era um termo que tinha conquistado os historiadores, mas que não tinha uma força, nem uma coerência adequada. Primeiro, porque admite um ritmo de tempo menor que pode ser confundido com uma forma de atemporalidade. Arriscando assim cair na mesma armadilha do estruturalismo. Em segundo lugar, porque mentalidades supõe um conjunto de pensamentos e sentimentos únicos para toda uma sociedade. Ou seja, ao eleger mentalidades como algo presente em todas as pessoas, independente de sua classe social, caíasse no risco de se menosprezar as relações sociais em si.
Por isso, Ginzburg adotou o conceito de circularidade de idéias, pois ele admite mudanças históricas (com temporalidades diferentes, é claro) e reconhece a importância das classes sociais. Os conceitos são assim: se multiplicam, se aperfeiçoam, etc...

Leio logo existo

Quadro de Stojan Milanov.
Paulo Freire, em um congresso sobre educação, deveria falar sobre a importância de se ler. Procurando exemplos no seu passado ele criou uma reflexão muito interessante: antes de lermos qualquer coisa escrita, lemos tudo ao nosso redor. A leitura do mundo vem antes da leitura das palavras. O bom leitor leva as duas para o resto da vida.
Ler o mundo significa interpretá-lo. E interpretação é um ato que só pode ser feito por uma pessoa que deixa de ser simplesmente um macaco de imitação para se tornar um indivíduo mais autonômo e crítico, um sujeito.
A pedagogia de Paulo Freire é justamente essa: a de transformar o homem em sujeito através da troca de saberes entre professor e aluno. Para o educador pernambucano, o professor não poerder de vista nunca que uma pessoa aprende muito mais com conteúdos que falam sobre o seu mundo. Do que adianta alfabetizar uma população ribeirinha usando como exemplos frases como "vovò viu a uva" ou "caçamos o urso". São coisas fora do mundo dos alfabetizados, coisas que se tornam relíquias na sua cabeça porque nã o estão no universo de sua vivência.
Ler é importante porque estimula a autonomia do indíviduo: ele entra em contato com vários estilos, vários saberes e com isso pode construir o seu próprio estilo ou divulgar o seu saber. Leitura deve ajudar a nossa expressão e nosso senso crítico. Freire defende uma leitura seguida de interpretação. Uma leitura que tenha algo a ver com os desejos ou o cotidiano da pessoa a ser alfabetizada. É preciso afinidade para despertar o desejo de aprender. E é preciso diálogo para ensinar. Essas são as lições de Paulo Freire sobre a leitura.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

A industrialização de São Paulo

Da antiga série "sínteses numa mesa de bar":


A Industrialização de São Paulo é um livro do brasilianista canadense Warren Dean que já falou da economia da borracha e da história dos desmatamento da Mata Atlântica. Nesse livro Dean quebra alguns mitos sobre a industrialização paulista.
Primeiro: todo mundo pensava que a industrialização paulista nasceu com a crise do café.
Dean mostra que os cafeicultores paulistas foram os homens que criaram a indústria na região. A maioria precisava conseguir novas maneiras de lucrar e outros investiam na indústria só pra ajudar a beneficiar e transportar seu produto.  Mas existiam também aqueles que não eram fazendeiros, mas também ajudaram a construir a indústria paulista. Quem eram eles? Imigrantes (especializados) e profissionais liberais.
Esse pessoal era contra os cafeicultores? É aí que chegamos no segundo mito: formou-se uma classe forte e unidade de industriais que lutavam contra o domínio do café e de outras exportações.

Warren Dean
Ora, vamos dar uma olhada na origem social dos imigrantes especializados e dos profissionais liberais. Os imigrantes que se tornavam industriais eram quase sempre técnicos, ou seja, aqueles que já tinham um conhecimento aprofundado sobre a fábrica. Eles começam a ser promovidos até se tornarem diretores da fábrica ou fundarem sua própria fábrica. Mas eles não tinham prestígio, eram vistos como aventureiros ainda. Por isso se casavam com as filhas de famílias tradicionais (principalmente de cafeicultores). Além disso, o sogrão sempre podia ajudar investindo um pouquinho ali e aqui.
Os profissionais liberais (advogados, gráficos, jornalistas, médicos, etc) eram geralmente filhos dos barões do café. Mandados com o dinheiro do pai para se formarem no exterior, conseguindo assim o tão prestigiado título de bacharel. Quando não se envolviam na esfera intelectual, optavam por criar empresas "modernas" na cidade.
O que temos então são dois personagens visceralmente ligados ao cafeicultor o que cria uma classe dividida: o industrial é um empreendedor que quer ser um nobre como o barão do café. Mas nem todos pensavam dessa mesma forma e isso provocava muitos atritos entre os próprios industriais. Era isso que os impedia de se organizarem tão cedo. Só na década de 1920 que surge a Federação da Indústria do Estado de São Paulo.
Terceiro mito: os industriais estavam tão bem organizados que reprimiam fortemente os operários.
O historiador acaba de nos mostrar que eles não estavam tão unidos assim, mas mesmo assim eles partilhavam (a maioria) de uma mentalidade autoritária para com seus empregados. Eles não eram organizados, o que acontecia é que todos possuiam a mesma idéia de como se devia tratar uma greve: com repressão das grossas.
Os industriais só iriam se unir mesmo a partir de 1930, quando os barões de café estão em franca decadência (com a crise de 1929) e Vargas consolida a industrialização nacional.
Para fechar: o livro de Warren Dean é importante porque ele quebra com muitos mitos, demonstrando que a industrialização de São Paulo foi algo rápido, mas a criação de uma classe unida foi lenta, graças á origem de seus membros e os momentos de crise que o país passava na Primeira República.

sábado, 13 de agosto de 2011

Lendo á contrapelo

A historiadora norte-americana Barbara Weinstein escreveu em 2001 um depoimento para a revista História, Ciência e Saúde: Manguinhos (da Instituição Fiocruz) relatando a sua experiência de pesquisa no Pará no começo da década de 80 da qual resultou o livro A Borracha na Amazônia: expansão e decadência (1850-1910). Hoje uma das leituras obrigatórias sobre a região graças á sua visão crítica da economia gomífera.
Nesse depoimento ela revela como escolheu seu tema e como a pesquisa foi cheia de dificuldades e surpresas. A principal dificuldade diz respeito á documentação. O descaso com os arquivos fez com que muitos documentos se perdessem, restando assim alguns jornais e documentos oficiais.
Assim sendo, Barbara defende que fazer história social na Amazônia significa fazer uma leitura á contrapelo das fontes. Leitura á contrapelo? Quer dizer, interpretar nos documentos a sua real mensagem, levando em conta o tempo e a origem social de quem o escreveu.
O pesquisador da história social anda atrás das relações entre os grupos sociais, principalmente entre a classe dirigente e a classe trabalhadora. Como se sabe, a classe trabalhadora dispunha de poucos meios de registrar sua história. Podemos encontrar alguns traços dela nos noticiários e queixas publicadas nos jornais ou nas reclamações recorrentes do governadores sobre determinados bairros.
Existe um tipo de fonte, contudo, que pode nos ajudar a fazer história social na Amazônia: a história oral. A história oral exige quase os mesmos cuidados com as fontes documentais: não esquecer de com quem você está entrevistando, as origens sociais dessa pessoa e sua posição ideológica, por exemplo.

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Aqui está o depoimento de Weinstein: Experiência de Pesquisa Histórica em uma Área Periférica: a Amazônia.

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

O anti-idealismo

O Utopista
Cena do filme O Conformista (1970) de Bernardo Bertolucci.
Murilo Mendes (1901-1975)

Ele acredita que o chão é duro
Que todos os homens estão presos
Que há limites para a poesia
Que não há sorrisos nas crianças
Nem amor nas mulheres
Que só de pão vive o homem
Que não há um outro mundo.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Sustentabilidade

Existe uma tradição no pensamento social construído na Amazônia que é a de abordar o velho embate entre o homem e a natureza. Tanto que o primeiro grêmio dedicado a estudar o Amazonas colocou a Geografia antes da História, diferente dos demais fundados pelo país - Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA).
Alguns partem logo para o determinismo geográfico explicando o subdesenvolvimento local como próprio do clima, da hidrografia e do relevo. Outros entendem como uma luta realmente entre civilização e irracionalidade (como o historiador Arthur Reis e o político Agnello Bittencourt entendiam), incluindo nessa última modalidade não só a fauna e flora local como também os povos indígenas. Outros entendem que a geografia influenciou sim o processo histórico amazônico, mas que boa parte da culpa do subdesenvolvimento local reside no próprio homem, principalmente nas elites que orientavam sua sociedade (aqui se enquadram os médicos Araújo Lima e Djalma Batista). Recentemente, a natureza começou a sair da discussão e entrou como chave de compreensão de nossa situação um sistema econômico mundial, o capitalismo. O capitalismo que teria moldado a Amazônia da forma como conhecemos (e aqui surgem os nomes da historiografia recente, de orientação neo-marxista, como Edinéia Mascarenhas, por exemplo).

A imagem da Amazônia no mundo é essencialmente a de pulmão do mundo, reiterando a natureza fantástica. Claro que essa imagem foi construída de acordo com a colonização e sobrevive até hoje com outros argumentos. O que é interessante é que quando se pensa na Amazônia a primeira coisa que vem á cabeça é a selva e não o homem que vive nela. O ribeirinho parece ter sido anulado por ela.
Quando alguém de fora visita uma das capitais amazônicas como Manaus se surpreende por não encontrar a floresta penetrando na selva de pedra. Ele se decepciona e sua imagem sobre a região se desintegra. Foi o que aconteceu com Euclides da Cunha ainda nos tempos da Belle Epoque.
Recentemente um articulista goiano que visitou a cidade, ou uma parte dela, se perguntava onde estava a cidade amazônica? Afinal, para ele Manaus lembrava qualquer centro urbano brasileiro. Pensava que aqui encontraria uma cidade sustentável, adequada á floresta tropical.
Na verdade, os projetos urbanísticos de Manaus tem sido criados tomando-se como padrão não aspectos regionais, mas extra-locais. Foi assim desde o boom da borracha, quando se almejava construir uma réplica de Paris e não uma cidade original. Hoje, depois da crítica de muitos intelectuais á Belle Epoque manauara, procura-se uma forma de viver adaptada á nossa região. Leandro Tocantins, por exemplo, dedicou boa parte de sua vida á procura de habitações que se adequassem ao nosso clima e á nossa história - inspirando principalmente no exemplo das casas ecológicas construídas pelo arquiteto Oswaldo Brakthe na Serra no Navio e na Vila Amazônia no Amapá.

Vila Serra do Navio
Pensar hoje que o homem dominou a selva simplesmente pela construção de metrópoles como Manaus ou Belém é uma ilusão. A maior parte da Amazônia ainda é um deserto. As rodovias, que não tem a manutenção que precisam, não ajudaram a povoar a região como se pensava. E quando esse povoamento foi praticado o foi feito de maneira desordenada, depredando o ecossistema e resultando em conflitos agrários.
A falta de infra-estrutura no interior aumenta o êxodo rural e assim as cidades incham. A habitação cada vez se torna mais precária. As tentativas de solucionarem esse problema não foram realmente ao ponto da questão - um urbanismo racional e políticas favoráveis ás comunidades ribeirinhas.

Isso sem falar do crescimento do desmatamento que tornará realmente a Amazônia em deserto se não for controlado. O problema do desmatamento sobrevive também por conta da vida precária no interior, afinal quem corta as árvores, á mando das madereiras ou do pecuarista, são moradores da região. Desmatar é dinheiro garantido para muitas pessoas. Enquanto não encontram uma alternativa melhor, persistirão nessa atividade.
Muitos se perguntam porque a ecologia não conquistou ainda boa parte da população nacional e internacional. O fato é que, dentre outros motivos, as pessoas só se atentam para algo que diga respeito diretamente á sua vida. Não há nada mais direto que o seu sustento. Enquanto não se reconhecer que na Amazônia ecologia e economia devem atuar juntas não chegaremos á lugar algum. Djalma Batista considerava o extrativismo uma atividade econômica que surgiu durante a colonização graças ás condições do meio, mas sua existência na atualidade é um grande erro, uma vez que já demonstrou sua fraqueza com a crise da borracha.

Sustentabilidade é uma palavra que se tornou moda hoje. Poucos sabem do que realmente se trata. Sustentabilidade significa garantir sua subsistência e o meio que a fornece. Mas sustentabilidade é mais que isso. É uma posição diante do mundo. Uma posição que não mais enxerga o homem como o predestinado a domar a natureza, que a fauna e a flora só existem para lhe servir. Essa visão, inspirada na religião e no cientificismo, está aí há mais de dois milênios. A religião e a ciência estão longe de serem as vilãs nesse caso, embora tenham sua grama de culpa - na ciência, por exemplo, podemos encontrar a engenharia ambiental, enquanto na religião, temos inúmeras religiões orientais que acreditavam na harmonia entre o homem e a natureza, isso sem falar do franciscanismo e da cultura indígena. Sustentabilidade é entender o mundo como um complexo, um sistema que precisa de harmonia entre seus elementos para continuar existindo. Nessa visão, o homem deixa de ser superior para ser semelhante á natureza, respeitando-a.
Os rumos que a Amazônia tomou nos últimos anos foram importantes para que ela se desenvolvesse, mas existe muito ainda a ser feito. A sustentabilidade se impõe, e já há algum tempo, como uma das alternativas para realmente desenvolvê-la. Mas não só a sustentabilidade. Como falamos aqui uma questão está ligada a outra. Sustentabilidade leva á economia, economia á política, política á cultura, etc. A questão indígena se liga com a questão da reforma agrária que se conecta, por sua vez, com a questão da urbanização e assim em diante.

Foto: Eduardo Luís Silva.
A Amazônia realmente é uma região única por essa influência do meio no homem. Sempre uma influência, nunca um determinismo. Justamente por isso a ecologia é um tema tão importante para a região, uma vez que nas demais essa relação é menos forte. Justamente por isso espera-se que a Amazônia tenha um papel de pioneira na construção/instituição de um novo paradigma: o mundo sustentável. Na realidade, a Amazônia já é pioneira, basta lembrarmos dos povos indígenas que já faziam manejo florestal antes dos portugueses chegarem nessa terra, segundo as pesquisas arqueológicas. Parece que esse pioneirismo foi esquecido, depois de tantos massacres e tanta ganância. Faltou na Amazônia que veio depois de 1500 o respeito com a natureza. E após tantos erros e massacres ainda se pensa que é assim que deve ser.

Os diagnósticos do Dr. Djalma Batista

Djalma Batista. Foto: Roberto Mendonça Furtado.
Quando Djalma Batista, médico acreano que se radicou em Manaus, escreveu Complexo da Amazônia em fins da década de 1970 pretendia fazer um grande diagnóstico de toda região. Para o bom doutor o diagnóstico era simples: o subdesenvolvimento. A razão dessa doença, contudo, era das mais variadas, mas um de seus principais motivos era o extrativismo. Para Djalma, desde a colonização até o século XX a história da Amazônia tem sido a história do predatismo, tem sido a luta do homem contra a natureza. Se parece que o homem está ganhando ao desmatá-la e polui-la na realidade ele só está se iludindo. Sem a natureza o homem morrerá. E na Amazônia isso fica muito claro, principalmente porque o solo amazônico é pobre de substâncias, se sustenta apenas com o material produzido pelas plantas e os animais. Uma vez varrido o manto verde a terra virará deserto.
A Amazônia para Djalma é um ecossistema importantíssimo e ao mesmo tempo delicadíssimo. Se o homem quer mesmo sobreviver deve preservá-la. Mas não transformá-la em um museu vivo, mas conviver com esse bioma, de forma respeitosa e inteligente. Isso é o que ele chama de "desenvolvimento auto-sustentado".
Como fazer isso? Antes de tudo sabendo onde estamos pisando. Sem os estudos dos cientistas talvez descobríssemos essa falsa riqueza do solo amazônico tarde demais. Djalma clama para a Amazônia cientistas. Só depois de conhecer e entender esse fantástico bioma é que saberemos exatamente o que fazer sem correr o risco de condená-lo e com isso a todos nós.
E tenta inventariar o que sabemos sobre a região com base em estudos históricos, geográficos e biológicos. Djalma Batista é um pensador muito sagaz que domina a interdisciplinaridade, pulando da Medicina para a Geografia como se fosse um verdadeiro especialista nas duas. Esse livro é a maior prova disso.
Após apresentar cada aspecto, não deixa de avaliar como ele tem sido tratado pelos nossos governantes, levando em conta sempre os lados positivos e negativos. Justamente por operar dessa maneira que o livro se tornou um tanto polêmico. Na última parte, destinada a analisar as políticas de desenvolvimento criadas na história da Amazõnia recente, Djalma critica o Banco da Amazônia, a Sudam e a Zona Franca de Manaus. Bom lembrar que essas instituições foram implementadas na Amazônia á pouco tempo e estávamos vivendo o momento do regime militar.
Esses são apenas alguns dos motivos que fazem desse seu livro essencial para todo aquele que procura conhecer e pensar realmente sobre a Amazônia. Muitos tem dito que Djalma é um homem á frente de seu tempo, principalmente por defender uma teoria ecológica antes mesmo do próprio movimento ecológico formulá-la completamente. Suas avaliações também eram altamente lúcidas, prevendo os efeitos desastrosos das políticas de desenvolvimento imediatistas como o inchamento das capitais e esvaziamento do interior, além da violência e da crise da infra-estrutura urbana.
O grande amazonólogo era sim um inovador, mas mesmo assim não fugia das influências do seu tempo. Djalma defendia um projeto nacional-desenvolvimentista, ideologia criada na década de 1950 e levada á cabo pela ditadura militar. Um dos pressupostos básicos dessa ideologia é acabar com o subdesenvolvimento através da industrialização, integrando o Brasil e não mais existindo aquele dualidade entre o Brasil urbanizado e rico e o Brasil pobre e rural. Ainda assim, Djalma não engole simplesmente a ideologia desenvolvimentista, repetindo o que os outros vinham dizendo. O intelectual a adota, mas antes critica alguns pontos que considera equivocados como considerar como desenvolvimento apenas o crescimento do poder aquisitivo. Para Djalma, o desenvolvimento é um processo mais amplo que envolve a política, a sociedade e a cultura.
A leitura de Complexo da Amazônia, portanto, é mais do que recomendada.

Massacrados pelo "heroísmo" ou atropelados pelo "Progresso"

Índios caçando onça., Johan Rugendas.
Arthur Cezar Ferreira Reis (1906-1993) quando publicou seu livro de estréia, História do Amazonas, em 1931, pretendia preencher uma lacuna e atender a um pedido. A lacuna seria a falta de um livro que desse conta da história do estado, já que antes o que havia eram apenas livros sobre determinados episódios como a Revolta Tenentista de 1924. O pedido seria o feito pelo carismático escritor e político local Álvaro Maia de incentivar os jovens a defender sua região através do culto á heróis cívicos locais. Essa é uma das teses defendidas pela historiadora Lademe Corrêa que analisou o livro de Reis.
Arthur Cezar Ferreira Reis.
O primeiro livro de história do Amazonas pouco falou sobre os povos indígenas. O grande protagonista era o colonizador português, entendido como um dos maiores heróis da história brasileira por ter enfrentado a natureza hostil. O indígena aparecia aqui e ali como ajudante do colonizador ou como seu inimigo bárbaro. A exceção é o líder da resistência indígena Ajuricaba, defendido anteriormente por Álvaro Maia, como um dos pioneiros na defesa do Vale Amazônico. Ajuricaba se tornou uma lenda na região e foi transformado num herói cívico pela sua bravura e coragem. No livro de Reis, Ajuricaba possui as mesmas qualidades do colonizador português: a bravura, a coragem, a intrepidez. Mas é claro, no livro, que ele é uma exceção.
Reis estava influenciado pela historiografia tradicional, principalmente em Francisco Adolfo Varnhagen, que enxergava na colonização portuguesa um ato magno de heroísmo ao tentar civilizar uma terra bravia. Varnhagen é o construtor da história oficial, da história do Estado Português e seu filhote, o Império do Brasil. Reis está na República, mas repete essa visão.
Em 1953, após entrar em contato com muitos pensadores nacionais como Gilberto Freyre, Luís da Câmara Cascudo e Sérgio Buarque de Hollanda, Arthur Reis começa a mudar de posição. Em um livro encomendado pelo Serviço de Informação Agrícola sobre a atividade gomífera Reis demonstra essa vontade de fazer uma história mais crítica e mais social - embora ainda persista aquele ideal tradicionalista da heróica colonização portuguesa na Amazônia. O livro em questão é O Seringal e o Seringueiro. Nele o autor dá especial enfoque aos migrantes nordestinos. Considera que a Amazônia venceu a estagnação econômica e cultural graças aos nordestinos que trouxeram consigo a sua resistência, a vontade de trabalhar, uma religião mais católica e uma linguagem mais brasileira. Em contraposição ao nordestino temos o caboclo amazônico que herda os traços negativos do elemento indígena, como a preguiça, o sincretismo e a dispersão.

Como vemos, Reis repete um preconceito antigo, atribuindo ao indígena traços psicológicos negativos. Ele não enxerga a diversidade do povo indígena. A preguiça aqui é entendida como vontade inata de não querer trabalhar, ao contrário de um meio de resistir a uma forma de trabalho diferente da que o indígena estava acostumado. O colonizador formou essa afirmativa ao entender a sua forma de trabalho como a única válida em todo mundo. Tanto é que quando Reis afirma isso não se embasa em estudos científicos, mas apenas em um desentendimento que com os anos tomou o status de verdade velada.

Djalma Batista
Djalma Batista (1916-1979) no artigo Da Habitalidade da Amazônia traça uma pequena história do contato entre o homem branco e o indígena. Conclui que a história da Amazônia tem sido a história do massacre, conclusão a qual Márcio Souza também chegaria anos mais tardes em seu A Expressão Amazonense. Djalma Batista denuncia o lado negativo da colonização: o genocídio. Lado esse que até então não tinha sido devidamente denunciado. No entanto, Djalma ainda possui alguns traços de etnocentrismo. Quando se refere aos indígenas utiliza sempre os termos "indiada", "bugres", "silvícolas" ou "bárbaros". Na última parte do artigo, quando pretende fazer uma pequena exposição sobre os traços psicossociais dos caboclos, adquiridos dos indígenas, elenca, além da culinária e dos hábitos corriqueiros como banhos em igarapés, a preguiça e o desrespeito com a propriedade.
Djalma também reproduz uma idéia presente nos anos de 1950, quando o artigo foi escrito, e que se acentuaria na década de 1960. A idéia de que o indígena está intrinsecamente ligado ao passado e de que sua cultura será destruída pelo desenvolvimento, pela industrialização. Entende-se assim a modernidade como um rolo compressor que condenaria os "primitivos". O que se pode fazer para amenizar os efeitos do progresso são as reservas indígenas.

Capa da segunda edição (2007).
Quando lança Complexo da Amazônia, em 1976, Djalma reitera as afirmações desse pequeno artigo, no entanto combate o desenvolvimentismo puro, o progresso a todo custo. Defendendo um desenvolvimento auto-sustentado (hoje fala-se de desenvolvimento sustentável) que preservaria a natureza e a cultura local (incluindo a indígena) aproveintando de ambas racionalmente.

O que podemos perceber nessa rápida análise sobre o pensamento desses dois grandes intelectuais, considerados como nomes essenciais á tudo que se refere sobre a história e a problemática amazônica, é que estavam ainda presos ao etnocentrismo (um mais que o outro). Mesmo o elemento indígena sendo mais presente no Amazonas, aqui se repetiria discursos fabricados em todo país de que o índio é preguiçoso e está condenado pelo progresso. Um discurso criado pelo colonizador, como apontou através de grande pesquisa empírica Victor Leonardi em Entre Árvores e Esquecimentos. O fato da maioria das sociedades indígenas brasileiras serem ágrafas, ou seja, não possuirem escrita, não permitiu que tivéssemos a opinião dos indígenas sobre a história nacional. Seu silêncio involuntário uniu-se á imposição do colonizador pela escravização, catequese ou ideologia. Hoje tenta-se romper esse olhar etnocêntrico tentando produzir uma historiografia indígena, mas nunca é demais lembrar que toda "verdade velada" é muito resistente, possuindo a capacidade de sobrevivência semelhante á das baratas.

domingo, 7 de agosto de 2011

Poesia Amazônica

Mandala de tucunarés de Francimar Barbosa.
Precisamos, enfim, de poetas, de muitos poetas na Amazônia, que eternizem no verso os anseios e os sentimentos do povo. Pedro Calmon os reclamou para a Bahia, e agora clamamos por eles, para que, mergulhados embora nas duras realidades e integrados nas mais adiantadas realizações, não percamos aqui o direito maravilhoso de sonhar. Sonhar, sim, que é a maneira melhor de ter o cérebro a ferver e o coração em festa! Poetas da Amazônia, deveis multiplicar-vos!

Djalma Batista , médico e intelectual acreano, em Cultura Amazônica (1963), no livro Amazônia: Cultura e Sociedade, 3 ed., Manaus: Editora Valer, 2006, p. 94.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

X Semana de História da Uninorte

Foto: Raoni Lopes.
De 13 a 17 de junho de 2011, comemorou-se na Uninorte os dez anos do curso de História. Como estava participando da organização do evento (fazendo parte da equipe de colegas que cuidou da estrutura e da divulgação) não pude dar maiores detalhes antes e nem atualizar o blog essa semana.
Pretendo fazer agora um pequeno resumo da X Semana de História, tentando relatar o máximo que eu pude acompanhar.
Primeiro tenho que esclarecer que a preparação para esse evento começou muito antes, no semestre passado, com a criação do projeto Clio, quando recrutamos os membros. Ainda no semestre passado começamos a entrevistar alunos e professores que passaram pela instituição nesses dez anos, como forma de criar uma memória para o curso. Por conta do tempo, nos concentramos nos atuais e antigos professores do curso.

Aluna da UFAM, Profa. Maria Eugênia de Mattos, Profa. Elisângela Socorro Maciel e Profa. Adriana Barata.
Foto: Maurílio Sayão.

De segunda á quinta recebemos estes professores, convidando-os a nos apresentar um pouco de seus trabalhos. Como temos um corpo docente diverso, os temas foram os mais variados também: desde de história cultural á história econômica.
Na segunda, recebemos a professora Maria Eugênia Mattos que nos falou um pouco sobre uma outra instituição de ensino amazonense: o Colégio Dom Bosco. Responsável pela formação da elite manauara a partir da década de 1920. Ainda no mesmo dia, Profa. Elisângela Maciel, nossa coordenadora, nos falou sobre seu tema: a romanização da Igreja Católica no Amazonas, focando principalmente a construção de Diocese de Manaus.
No dia 14 de junho, pela manhã, foi a vez da Profa. Cristiane Manique e do Prof. Tarcísio Serpa Normando  apresentarem seus temas. A professora Manique pesquisou a atuação da elite presente no Vale do Itajaí (RS) e descobriu as diversas formas que esse grupo social utilizou para se reafirmar (seja através de casamentos, da criação de clubes recreativos, etc.) A contribuição do professor Tarcísio veio através de uma reflexão sobre o futebol amazonense, relembrando o seu início elitista (trazido como um dos costumes "civilizadores" para o estado na Belle Epóque ainda) e seu atual estado, com as perguntas que vieram após sua explanação.

Prof. Pedro Mansur Andes e Prof. João Rozendo.
Foto: Raoni Lopes.
Na parte da noite, tivemos as palestras dos professores João Rozendo e Pedro Mansur Andes. Os dois trouxeram um novo olhar sobre duas famosas zonas da história do Amazonas: a Belle Epóque manauara e a Manaus após o boom da borracha. Enquanto uma é vista apenas em suas transformações urbanas e econômicas, outra nem se quer é alvo de maiores análises uma vez que é tida como uma época de colapso da cidade e do estado. Prof. Rozendo lembra a questão política utilizando a imprensa, destacando o início da República no Amazonas, enquanto o Prof. Andes estuda os movimentos sociais (principalmente as greves) na cidade de Manaus após a economia gomífera. Na mesma noite tivemos ainda a apresentação da peça Ainda Ontem sobre a ditadura militar. Peça escrita e dirigida por Taniouska Souza, ex-aluna do curso.

Profa. Elisângela Maciel e Prof. Arcângelo Ferreira.
Foto: Olga Almeida.
Na quarta-feira, pela manhã, recebemos o Prof. Arcângelo Ferreira, a Profa. Adriana Barata e a Profa. Patrícia Rodrigues. Sendo que o primeiro nos apresentou um pouco do universo do movimento artístico que surgiu em Manaus na década de 1950, o Clube da Madrugada, ressaltando inclusive o seu chão histórico. Enquanto a professora Barata nos falou sobre o leprosário de Paracatuba, criado na década de 1920 para cuidar dos hansenisicos e para afastá-los da cidade. Sua palestra nos ajudou esclarecendo bastante coisa sobre a doença. A professora Patrícia Rodrigues nos apresentou um pouco de seu trabalho sobre a Feira da Manaus Moderna, destacando a proposta política e social por trás desse plano urbanístico.

Profa. Elisângela Maciel, Sandro Santos, Profa. Patrícia Sampaio e Profa. Adriana Barata.
Foto: Sandro Santos.
Á noite, recebemos a Profa. Patrício Melo Sampaio que nos apresentou um pouco da sua temática central: a condição do negro e do indígena no Amazonas através da legislação, seja ela colonial ou imperial. No mesmo dia foram homenageados alguns alunos que passaram pelo diretório acadêmico de História. O Prof. Maurício Aurélio Couto, decano do curso, não pode infelizmente comparecer para falar sobre seu tema de trabalho (o uso das imagens no ensino de História) por conta de problemas pessoais, mas foi brevemente apresentadas as linhas mestres de seu estudo que tomava como exemplo dessa relação entre tecnologia e história o cinema de Silvino Santos.

Profa. Francisca Deusa e Profa. Elisângela Maciel.
Foto: Maurílio Sayão.
Na quinta-feira, pela parte da manhã, ouvimos a Profa. Dorinethe Santos Bentes expor seu trabalho sobre as representações de Manaus nos últimos anos do boom da borracha através das imagens. Em seguida, a Profa. Ana Paula Rabelo explanou um pouco sobre algumas obras arquitetônicas da cidade construída durante o boom da borracha, como o Teatro Amazonas e a Igreja Matriz, lembrando a importância artística e histórica dessas obras. Na parte da noite, tivemos uma mesa-redonda com a Profa. Francisca Deusa Costa e com a Profa. Elisângela Maciel Soares. Na condição de ex-coordenadora e coordenadora atual do curso, respectivamente, elas relembraram alguns momentos interessantes sobre o curso, como por exemplo a repercussão do 11 de setembro de 2001 nas turmas iniciais. Após a mesa-redonda, todo o corpo docente do curso foi presentado com um prêmio simbólico, uma ampulheta totalmente feita de vidro. O evento foi encerrado com a apresentação da cantora Jade Souza e da Banda Rouxinol.

Nosso "arraial" na sexta-feira.
Foto: Raoni Lopes.
Sexta-feira foi o dia de nossa festa junina que contou, além dos quitutes básicos, algumas provas, parte da gincana entre as turmas de História. A empolgação foi grande e tivemos boas gargalhadas. O terceiro período da manhã foi o ganhador da gincana. Não poderia faltar a tradicional quadrilha que apenas coroou a animação da noite.
Na minha opinião, o evento superou nossas expectavivas. Ainda que tenhamos enfrentado algumas dificuldades, próprias de eventos de tal porte, conseguimos superá-las e aprender com elas. Foi uma ótima oportunidade para conhecermos melhor nossos professores e seus objetos de estudo. Suas falas nos ajudaram muito no sentido de entender o trabalho da pesquisa e do ensino. Estimularam muito o interesse pelo curso. Além disso, foi uma grande oportunidade de unir as turmas do curso. E foi, com certeza, na sexta-feira que percebemos que tínhamos alcançado um pouco desse objetivo. Foi uma experiência e tanto e não posso deixar de agradecer á Profa. Elisângela e todos meus colegas da equipe Clio por vivenciá-la. Á todos muito obrigado e nos vemos na XX Semana de História, se Deus quiser!
Equipe Clio em momento de descontração.
Foto: Sandro Santos.
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Esse texto foi originalmente escrito em 25 de Junho de 2011, mas consegui a autorização das fotos apenas agora.