sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Algumas músicas interessantes do Segundo Festival Amazonas de Música:

Anjo de Cor
(Compositor e intérprete: Afonso Toscano de Melo)

Ê São Benedito
Chegou a hora de abençoar
Nosso irmão Nestor
É um anjo de cor
A sua força não pode faltar
É Nestor Nascimento
Que por nascimento
Nasceu brasileiro
De Luanda, de Angola,
Da Praça 14 de Janeiro
Ele é filho de xangô
Qual o pai é um guerreiro
Na resistência da raça
Foi sempre o primeiro
Ê São Benedito
Foi mamãe Sofia
Que lhe ensinou a soletrar,
Com sua tia Lurdinha
Compreendeu o ritual
De Benedito, do mastro
De Fátima, da procissão
O tambor do candomblé
Festa no jaquerão
Mil amores, mil donzelas
Cada donzela um varão
Ê São Benedito...
Batalha do Calabouço
Defendendo a nação
Encarando a polícia
Do ditador de plantão
Briga de estudante
Chupando manga com cão
Dentes quebrados, surdez
Quase perda da visão
Nestor, meu anjo de cor
Nada disso, foi em vão.

Amazônia Terra de Ninguém
(Compositor e intérprete: Ivan Nunes Moraes de Melo)

Ontem eu andei pela floresta encantada
E de repente ouvi todo o temor da macacada
Pássaros voando em revoada
E o homem destruindo toda mata.

Ontem acordei até mais cedo
E vi todo deserto pelo espelho
um clarão na selva se formando
E nossa Amazônia se acabando.

Que coisa triste, quantos deslizes
A selva mais bonita do planeta
Agora está virando uma espoleta.
U.S.A. montando as bases
Amazônia só disfarces
U.S.A. montando as bases
Amazônia só disfarces

Amazônia terra de ninguém
Amazônia estamos refém
Amazônia pátria mãe querida
Amazônia ainda tem saída.

No Reino das Palafitas
(Compositor e intérprete: Cileno de Oliveira Conceição)

É... A feira da Panair já foi Pan-Air.
A fúria do Prosamim secou igarapés
O expresso passou tão ligeiro e eu a pé
A espera de um tal de monotrilho, se vier...
Ei... O porto privatizado já foi Rodoway
No Cine Ypiranga me vi na Broadaway
Bandido, mocinho, um herói fora da lei
No reino das palafitas eu era um rei.

Sim, Manaus é saudade, é Praça da Matriz
Passeio de bonde, banho de chafariz
Eu, curumim, um moleque, mas feliz
Sim, Manaus do encontro das águas pontual
Teatro Amazonas, amigos de quintal
Estórias e lendas de boto e coisa e tal...
Sim, Manaus é mais que "porto de lenha" e "liverpool"
Mais que Zona Franca, Zona Norte, Zona Sul
É o coração de uma gente batendo tum tum tum.

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Cultura, industrialização e alguns gatos

Robert Darnton dizia que o passado é uma terra estrangeira. Quando assistimos trabalhadores matando gatos e morrendo de rir com isso, na passagem do século XVIII para o XIX, temos de concordar com ele. O que há de tão engraçado em matar gatos? A resposta só pode estar no passado, na terra estrangeira em que eles viveram. Esse estranho fato chamou a atenção do pesquisador norte-americano que tentando descobrir seu significado acabou fazendo uma história cultural dos primórdios da industrialização na França.

Robert Darnton
Quem relata o massacre de gatos é um tipógrafo que em um pequeno caderno conta como foi o começo de sua carreira profissional. Na época, esse tipógrafo trabalhava numa oficina e partilhava com um amigo muito zombeteiro um quarto. Ao contrário do que a historiografia tradicional pensa, o período da pré-industrialização não foi assim tão pacífico quanto se imaginava: o tipógrafo nos conta que a vida de aprendiz (iniciante no ofício) era dura, com péssimas condições de trabalho, de higiene e de moradia. Além disso, havia o ódio contra o patrão. Enquanto os aprendizes quase se matavam de trabalhar, o dono da oficina esbanjava dinheiro e tinha mais cuidado com os inúmeros gatos que sua mulher criava do que com seus trabalhadores.

O historiador acredita que na época já havia uma certa consciência de classe: os trabalhadores, por causa de sua péssimas condições de trabalho, se uniam, mas ainda não partiam para a luta de classes explícita. A prova de que eram unidos está nas inúmeras agremiações que os tipógrafos tinham, quase sociedades secretas destinadas aos melhores e mais confiáveis trabalhadores. Outra prova pode ser encontrada nos rituais por que os aprendizes tinham que passar para serem considerados verdadeiros tipógrafos.
Mas vamos ao caso dos gatos: o amigo gozador do autor do caderno de memórias resolve empregar uma peça no patrão. Durante a noite vai até a sua casa e fica miando. A sua intenção é não deixar o burguês não dormir direito. Mas acaba tendo um efeito colateral: por causa dos miados insistentes, o patrão acredita que os gatos estão endemoniados e no dia seguinte pede que os seus empregados se livrem deles, menos da gata cinza (a favorita de sua mulher). É justamente a gata cinza o alvo de toda fúria: ela é enforcada. Os demais foram mortos á pauladas, enquanto todos riam.

Darnton entra no folclore da época para tentar entender o significado da figura do gato e descobre que ele poderia simbolizar desde a ligação com a feitiçaria, a sensualidade desenfreada e a identificação com o dono. Portanto, quando enforcaram a gata cinza poderia estar dizendo que sua dona era uma bruxa ou uma adúltera, ou podiam estar fazendo o que queriam fazer com seus donos - enforcá-los.
O massacre de gatos em sim demonstra que no início da industrialização na Franca existia sim uma luta de classes, mas através do simbolos. Os trabalhadores usavam dos elementos de sua cultura e das mentalidades do período para poder atingir o patrão, para ridicularizá-lo, como fizeram os tipógrafos com os gatos do dono da oficina. Era uma luta de classes onde o humor e a cultura andavam de mãos dadas.

sábado, 24 de setembro de 2011

O curioso caso do Rabi Emmanuel Muuyal

O Túmulo de Rabi Shalom Imanu El-Muyal. Foto: Equipe Desvairada Baricéia.
Um rabino como santo popular? Parece até um conto de Millôr Fernandes, mas é verdade. No Cemitério São João Batista, o túmulo do rabino (ou rabi ou ribi, como se fala no Oriente Médio) Emmanuel Muuyal ou Shalom Imanu El-Muyal tornou-se foco de uma devoção popular. Muitos vão ali pedir pequenos milagres e quando atendidos fazem questão de deixarem no túmulo (cercado por um pequeno muro para explicitar a origem não-católica do homem ali enterrado justamente porque na época não existiam cemitérios israelistas em Manaus) votos, agradecimentos.
Hoje seu túmulo se encontra no Cemitério Israelita, ao lado do Cemitério São João Batista, no Boulevard. Foi preciso construir uma grade para que a quantidade de votos não engolisse o próprio túmulo. A Comunidade Judaica de Manaus, a cada ano recitava uma prece pelos que ali descansam, e foi assim que acompanharam, ano por ano, o crescimento da devoção ao "santo rabino milagreiro de Manaus". Turistas israelenses já vieram a Manaus só para conhecer o tão falado rabi, prova de que sua devoção ultrapassou os limites da Amazônia.
Na década de 1980, seu sobrinho, Eliahu Muyal, figura importante na política israelense (membro do Parlamento de Israel e Ministro dos Transportes) tomou conhecimento através de um amigo que foi visitar Manaus que seu tio tinha sido sepultado ali. Logo endereçou uma carta ao presidente da Comunidade Judaica de Manaus, o então professor Samuel Benchimol, pedindo que os restos mortais de seu tio fosse transladados para Israel. Benchimol pensou bastante e respondeu que não poderia fazer isso, já que a comunidade católica da cidade ficaria furiosa ao verem um de seus santos milagreiros serem retirados de sua terra.
Engraçado. O rabi Muyal tinha vindo á Manaus á pedido de seu mentor e grande amigo Rabi Refael Encáua, chefe da Comunidade Judaica Marroquina, justamente para aprofundar o judaísmo na Amazônia e acabou sendo cultuado como santo pela população amazonense que é, em sua maioria, católica. O rabino aqui chegou em 1908 e veio a falecer dois anos depois, vítima de uma doença tropical. Os milagres teriam começado não muito tempo depois de ter sido enterrado. A fama de milagreiro se espalhou e hoje existem inúmeras histórias sobre as "graças alcançadas". Essa é uma das tantas ironias da História. E, no caso, uma boa ironia, uma vez que ajudou a aproximar a população local com a cultura judaica. Mesmo que tenha deturpado um pouco seu significado, esse culto popular é um elo de ligação importante com a comunidade hebraica que tanta importância tem em nosso Estado.

Mais informações sobre o caso do Rabi Muyal:
-Documentário Eretz Amazônia- Os Judeus na Amazônia (2004), dirigido por Alan Rodrigues (veja aqui o trailer);
-Artigo de David Salgado, A Verdadeira História de Ribi Muyal, na revista digital Morashá.

Tambor de Mina

Pórtico da Casa da Mina Reino de Daomé de Xapanã. Foto: Pai Jean de Xapanã.
Sábado passado eu e um grupo de colegas visitamos a Casa de Mina Reino Daomé Lego de Xapanã, na Cidade Nova, administrada por Pai Jean de Xapanã ou Toy Azondelo de Xapanã, para entender melhor essa religião de matriz africana que nasceu no Maranhão por volta de 1840 e que hoje existe em quase todos os Estados da região Norte (Amazonas, Maranhão, Piauí e Pará principalmente). 
A Casa de Minas vem da nação Jeje, enquanto a Casa de Nagô, como o próprio nome diz, pertence á cultura nagô. Por que então o nome Tambor de Mina? Mina era uma localidade na costa africana, onde hoje existe a República de Gana. Essa região foi batizada como São Jorge da Mina pelos portugueses que chegaram a construir um forte ali. Todos os habitantes dessas paragens recebiam o nome genérico de Mina, denunciando a sua origem e depois a sua nação.Por exemplo, existiam os Minas-jejê e os Minas-nagô.
A primeira manifestação do culto se deu em São Luís do Maranhão na década de 1840. Ali foi construída a Casa Grande das Minas Jejê (também conhecida como Querebantân de Zomandônu) e quase na mesma época uma Casa Nagô também foi erguida no mesmo bairro. Querebantân significa "palácio" na língua jeje, enquanto Zomandônu é um título real. Esse título pertencia á Maria Jesuína, que em terras tupiniquins era apenas mais uma escrava, mas que no Reino Daomé era a rainha Nã Agotimé, presa após a morte de seu marido e vendida como escrava graças a um complô político.
O culto é conhecido por seu comportamento muito comedido, ou seja, a maioria dos rituais são secretos. A própria transe é muito discreta e o simbolismo dos terreiros é enorme. Muitos classificam o Tambor de Mina mais como uma dança popular que propriamente uma religião, já que a dança é a parte mais divulgada sobre o culto. Na Casa das Minas o culto é mais restrito ainda. Nesse sentido, Pai Francelino de Xapanã foi um importante divulgador da Casa de Minas e do Tambor de Mina em si, ajudando a quebrar as imagens preconceituosas que muitas pessoas nutrem sobre essa religião. A prova maior de seu empenho talvez seja a fundação de uma Casa das Minas em São Paulo, ou seja, além do eixo Amazônia-Nordeste.
O universo do Tambor de Mina é muito rico e aqui não falei nem metade do que ele compreende. Nossa intenção é fornecer informações que sirvam de trampolim para futuras pesquisas de interessados. Esse foi um texto, portanto, introdutório. Pretendo falar mais sobre essa importante religião afro-brasileira tão forte aqui no Norte do país, mas, por enquanto, vou deixar vocês com algumas palavras essenciais sobre o Tambor de Mina:

-Assentamento: espécie de altar dedicado a um vodun em especial;
-Autuar: quando alguma pessoa está incorporando um vodun ou encantado diz-se que ela está autuada.

-Encantado: toda aquela pessoa que não conheceu a morte, que foi para um plano além deste sem ter passado pela morte. Chama-se encantaria o ritual em que se chamam os encantados ;

-Vodun: o equivalente ao Orixá na Umbanda, é uma entidade mais evoluída. Um encantado pode se tornar um vodun, portanto;

-Vodunsi: nome dado á pessoa que incorpora um vodun;

Obs: Tanto os encantados como os voduns, na maioria das vezes, se organizam em clãs, famílias ou "panteões" como diz o pesquisador Sérgio Ferreti. A maioria não tem origem nacional e possui alguma ligação com a realeza. Por exemplo, D. Sebastião, o nobre português que sumiu nas batalhas contra os mouros no Marrocos, e as princesas Flora, Luzia e Rosinha, de origem turca. Mas muitos também tem origem humilde e local, como a Família dos Botos, Índio Velha, Caboclo Pena Branca, dentre muitos outros.

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Alguns hectares de polêmica

O Amazonas estava falido. Era o que muitos pensavam na década de 1920 quando as seringueiras plantadas na Ásia tinham finalmente superado as amazônicas. Mesmo assim ainda havia muito dinheiro circulando pelos Estados, mas para poucas pessoas. A família do governador César Rego Monteiro era uma delas. A corrupção e o nepotismo do governo Rego Monteiro é folclórica. Foi ela que motivou, segundo Eloína Monteiro, dentre outros motivos, o sucesso da Revolta Tenentista de Manaus em 1924.

Cézar Rego Monteiro
Uma das muitas tramóias de Rego Monteiro foi pedir um empréstimo aos Estados Unidos em 1922 dando como garantia de pagamento alguns hectares de terras do Amazonas. A oposição fez a história chegar até o governo federal que desaprovou imediatamente a medida. Rego Monteiro tentou se justificar dizendo que o empréstimo era para pagar os funcionários públicos e os norte-americanos poderiam compartilhar suas técnicas com os amazonenses para ajudá-los a superar aquela fossa em que se encontravam. A União bateu o pé e o governador teve de ceder.
No entanto, tal idéia continuaria na cabeça de governadores posteriores. Efigênio Sales, por exemplo, negociou com um deputado japonês (Tsukasu Uyetsuka) a fundação de uma colônia japonesa no Estado, ficando a crítério do político oriental o local em que ela seria erguida. Além de conceder alguns hectares de terra á um representante do governo norte-americano, Efigênio voltaria a conceder terras para criação de colônias japonesas em 1928, nas cercanias de Maués. A justificativa era trazer a disciplina dos japoneses para ajudar o Amazonas, além de, é claro, tentar saldar as dívidas com a compra das terras.
General Nélson Mello
Em 1930, o sucessor de Sales, Dorval Porto, reparte muitos acres de terra entre três empresas estrangeiras (duas norte-americanas e uma canadense): Amazon Corporation, American Brazilian Exploration Corporation e Canadian Amazon Company Limited. Essas empresas queriam verificar se existiam minérios na região, como carvão e petróleo. A maioria do estudos geográficos feitos no Amazonas e no Brasil sobre a região diziam que essa terra não teria qualquer minério precioso, tal como pensavam os conquistadores, portanto, Dorval não se preocupava em ter dado de bandeja para os estrangeiros algumas jazidas. O prazo de pesquisa e exploração era de 50 anos, podendo ser prorrogado. Só não o foi porque em 1930 a República Velha acaba com a chegada de um moço gaúcho muito carismático na presidência. O interventor escolhido para o Amazonas, o general Nélson Melo, abomina tal ataque á nossa soberania e anula o contrato em 1933.
Fiquei sabendo há algum tempo que um rico empresário europeu tem alguns hectares da floresta amazônica só pra si.  Não duvido nada que a resposta do governo para ter cedido esse pedaço de terra não terá sido "foi para saldar as dívidas".O historiador Arthur César Ferreira Reis dizia que a entrada dos estrangeiros na Amazônia não é de hoje e ela não acabará, apenas se refinará. Conceder terras é um aspecto muito explícito dessa penetração. Outro muito mais sutil pode ser o financiamento de grupos de pesquisa e de instituições de ensino. Todos sabemos que a ciência e a educação não são inocentes. E a Amazônia é cobiçada por motivos vários.

Existe um discurso que acompanha as pretensões imperialistas sobre a Amazônia. Ele basicamente diz que o homem amazônico não sabe administrar a riqueza com que convive. A maior prova seriam os altos índices de desmatamento, os trágicos confrontos de terra, a terrível poluição dos rios e etc. A solução seria transformar a região em um patrimônio da Humanidade, porto para qualquer país interessado em preservá-la. Uma espécie de Antártica tropical. Sabemos que a Antártica é um deserto de gelo, mas aposto que se ela tivesse as mesmas riquezas vegetais, animais e minerais que a Amazônia teria se tornado um deserto graças áqueles que juram protegê-la.


Não sabemos mesmo como viver com toda essa riqueza, ora a maior prova vem dos atos dos governadores relatados acima. Mas daí entregar nossa região á nações que não souberam lidar com suas próprias riquezas ecológicas é pular da panela para o fogo. Por que não conscientizar o homem amazônico? Por que não incutir nele o respeito pela floresta, pelos rios e pelos animais? A Amazônia seria preservada pelos seus próprios habitantes. Aí os "defensores" da internacionalização da Amazônia ficariam chupando o dedo. Essa solução, mais prática e mais eficiente, não é lucrativa para eles, por isso é sempre descartada. É um argumento que nunca aparece no seu intricado discurso.

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Nestor, a alma do movimento negro no Amazonas

Me lembro de ter ouvido da professora Arlete Anchieta, presidente do Fórum dos Afro-descendentes do Amazonas, em uma palestra que no Amazonas existiram poucos movimentos sociais negros, tirando o MOAN (Movimento Alma Negra). "Havia só o Nestor Nascimento há uns anos atrás dizendo, sozinho, que era negro numa terra de gente morena".
Nestor Nascimento (1947-2002) fundou não só o MOAN, como também participou da fundação da Escola de Samba Vitória Régia. Advogado por formação, atuou por muitos anos como professor (aliás, o primeiro curso pré-vestibular de Manaus, Dinâmico, era seu).
Estou falando de Nestor hoje porque acabei de ler o ótimo post do Simão Pessoa sobre seu amigo. Aconselho á todos os interessados em História do Amazonas, da cultura afro-brasileira ou dos movimentos sociais no Amazonas que leiam esse post tão cativante: Meu Amigo Nestor

domingo, 18 de setembro de 2011

Um poema sobre a morte

SONETO ABERTO SOBRE A MORTE
Alcides Werk (1934-2002)



Hoje é dia de festa nesta casa:

festa dos círios e das lamparinas.

Um corpo magro sobre a mesa, e a porta

de esteira aberta para os companheiros.



Beatas, terço, cafezinho, estórias,

o choro inútil da mulher sozinha,

a promessa do céu dos escolhidos

e uma herança de palha e de abandono.



Brasileiro, do norte, agricultor.

Semeou, semeou a vida inteira,

fez o campo florir por tantas vezes,



alimentou mil pássaros vadios,

foi sempre bom, mas nunca teve sorte,

e se vestiu de trapos para a morte.


Alcides Werk

Uma idéia conveniente

Ano passado chegou aos cinemas o filme "A Origem", de Christopher Nolan. A história gira em torno de um futuro não muito distante onde se pode entrar nos sonhos de outras pessoas. O filme acompanha uma equipe de especialistas em invadir sonhos, contratados para descobrir segredos industriais, que recebe uma proposta indecente de um empresário. O que eles tem de fazer é complicado: não vão roubar um segredo, mas plantar uma idéia. Os protagonistas explicam porque tal ação é tão difícil: uma idéia é difícil de ser plantada porque sempre haverá um rastro de quem a plantou.

Por que estou falando disso? Nos últimos dias li o livro de Edgar Decca, O Nascimento das Fábricas, que analisa o processo descrito no título de uma perspectiva diferente: o mundo das idéias. Por que isso? Decca acredita que a ideologia criada no início da industrialização foi tão bem construída e tão bem difundida que ela chegou até na historiografia. Daí que muitos historiadores explicam o nascimento das fábricas através do elemento produtividade. Ou seja, as fábricas nasceram graças ás máquinas, criadas na Revolução Industrial, que trouxeram novas técnicas de produção.
Segundo Decca, as máquinas não determinaram o nascimento das fábricas. O que ajudou e muito ao nascimento das fábricas foi a mentalidade burguesa, formada gradativamente, segundo a força que a burguesia ia adquirindo com o tempo. O que dizia essa mentalidade? Primeiro, ao contrário do que se dizia antes, o trabalho não é algo ruim. As sociedades da Antiguidade sempre consideraram o trabalho como um castigo ou uma tortura (basta lembrarmos que o princípio básico para ser nobre é não ter que trabalhar). Em segundo lugar, o trabalho produz lucros. Quanto mais eficiente e racional o trabalho, mais lucros serão obtidos. Quanto mais disciplinado o trabalhador, melhor será o seu trabalho.

O burguês era o homem que mexia com dinheiro, por isso ele valoriza o trabalho. Mas a maioria apenas comercializava o produto de outros trabalhadores, como os artesões. O problema, para o burguês, é que o artesão não tem um nível de produção regular, isso porque ele tem muita autonomia, afinal, os meios de produção são todos dele. As fábricas nascem quando o burguês reúne os trabalhadores em um espaço e empresta os meios de produção para eles. O que se exigia nas fábricas era disciplina, por isso existiam capatazes e punições terríveis a quem não fosse "ordeiro". O interessante é que esse zelo foi tão reafirmado que acabou penetrando dentro dos trabalhadores. Reafirmado como? Não era só através do "vigiar e punir". Não era raro muitos padres ou pastores apoiarem o trabalho fabril como alternativa á preguiça, um dos pecados capitais, visto como solo fértil para outros pecados. Os cientistas sociais, que surgem nesse período de mudanças radicais, não fogem á regra: o trabalhador que não é disciplinado logo se tornará um criminoso ou um vagabundo. O trabalhador deve reconhecer seu papel na sociedade, aprender e exercer sua função, senão a sociedade desabará. Além disso, o trabalho traz muitos benefícios ao homem, principalmente na saúde (o que muitos não percebiam era a falta de segurança no trabalho, dentre outros fatores).

O patrão, o capataz, a ciência e a religião diziam basicamente a mesma coisa, com conceitos e palavras diferentes. Eles produziram uma ideologia, um conjunto de idéias que toma status de verdade, que incutiu nos trabalhadores que a fábrica era o único meio de se sustentar e a disciplina a única maneira de continuar nas fábricas. As máquinas aqui serviram como instrumento para assegurar isso: a ameaça de mecanizar a produção assustava os operários, preocupados em perder o seu emprego.
A classe social burguesa fez o que a equipe do filme fez na cabeça de sua vítima: plantaram uma idéia. De tal forma que não se percebe de onde veio tal idéia. Ela foi estendida á toda sociedade. Disciplina e produtividade são palavras de ordem para todos os grupos sociais. Palavras que apagam, de certa forma, desejos de autonomia e de revolta. Na realidade, tais sentimentos nunca deixaram de existir, o que Decca quer dizer é que seu objetivo, no campo das idéias, era evitar a sua proliferação. Ao contrário do que vem se afirmando, as fábricas não nascem graças ás máquinas, mas devido á ideologia criada pela classe burguesa, na qual as máquinas foram usadas como um dos tantos instrumentos de sua reafirmação.

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Aniversário

Três anos passaram muito rápido. Quando fiz esse blog em setembro de 2009 pensei que ele duraria uns dois anos. Depois do primeiro ano, pensei que ele só duraria dois meses. No entanto, aqui está ele! Três anos depois, firme e forte. Se bem que nem tão forte assim.Vocês, que me acompanharam desde o início (sim, mãe, a senhora também está incluída nesse time!), sabem que existem períodos em que sumo e esse blog acaba hibernando, mas mesmo assim ele sobrevive. Balança, mas não cai!
Bem, o objetivo era divulgar a História, mas não a todo custo. Tanto que nunca fiz uma propaganda intensa sobre ele. Apenas o apresentava a pessoas que considerava curiosas ou que poderiam dar contribuições significativas aqui expondo suas idéias. Ou seja, a maioria dos meus amigos. A maior parte dos comentários e das discussões, contudo, ficaram fora do mundo virtual: na sala de aula, na rua ou em casa. Pode não parecer, pela pequena quantidade de comentários, mas os posts foram muito produtivos.
Por causa desse recurso do Blogger de ver o movimento do blog pelas estatísticas, pude constatar que o movimento não era tão modesto assim. Na realidade, existiam cada vez mais visitas a partir do segundo ano. Os motivos? Eu passei a escrever mais posts e a tocar no assunto "Amazônia" (o que atraiu e muito a atenção de visitantes de outros países) e a divulgá-los no Facebook.
Sobre as postagens, esse blog conseguiu uma façanha: não caiu em temas comuns. Como assim temas comuns? Geralmente, blog de História sempre volta á alguns pontos como ditadura militar, Segunda Guerra Mundial, Idade Média, etc. A maioria dos posts desse blog versaram sobre história regional (tanto de Taubaté como de Manaus) e historiografia, que são dois temas que muito me agradam.
No início, temendo que ao discutir temas polêmicos os comentários enviados se desviassem do bom senso, evitei tocar em assuntos do tipo. No entanto, hoje, já sem medo de radicalismos, decidi falar o que penso. Até porque ninguém comenta nada aqui mesmo!
Deixando as brincadeiras de lado, esse blog é muito importante para mim. Não só porque me divirto escrevendo os posts, mas também porque ele me ajudou e muito a amadurecer meu pensamento e minha escrita. Quem for até as primeiras postagens com certeza vai perceber essa evolução. Muitas vezes estudava para uma prova através dele: resumindo os assuntos e os postando aqui. E hoje, quando encaro o desafio de produzir meu TCC, ele é essencial para treinar o modo como apresento o objeto de estudo, a justificativa, etc. Resumindo, esse blog é como se fosse meu laboratório. E tomara que o seja por muitos anos.

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

A Operação Historiográfica III

Vamos falar sobre as práticas e técnicas usadas pelo historiador em sua pesquisa. Em primeiro lugar, o que é uma técnica? É um dos tantos instrumentos que ajudam a pesquisa. A técnica diz respeito a um conjunto de saberes que aplicados podem nos levar a uma interpretação de determinado objeto.
O que denuncia o tempo em que foi feito certo estudo histórico são justamente as técnicas que o historiador usa. "Falando em geral, cada sociedade se pensa 'historicamente' com os instrumentos que lhe são próprios" (p. 78). Atualmente, a universidade não é tanto o lugar da técnica, porque elas se prestam muito mais á trabalhos teóricos (mais uma crítica de Certeau ás universidades francesas). A técnica repousa em cima de disciplinas em separado, "ciências auxiliares" como a arqueologia ou a paleografia, etc.
Para Certeau, a pesquisa fica numa fronteira. A fronteira entre o que é dado e o que é construído (ou, entre o natural e o cultural), porque a pesquisa é justamente pegar um determinado objeto e, através de técnicas, torná-lo inteligível. O objeto de estudo que é concreto, depois do trabalho do pesquisador se torna abstrato, simbólico também. Devemos prestar atenção justamente nisso: nesse processo de transformação do concreto para o abstrato que a pesquisa faz.

O historiador transforma seu objeto em História. Como ele faz isso? Através de alguns passos. O primeiro é a seleção das fontes. Quando se fala em fontes, qual o primeiro local que vem á sua cabeça? Os arquivos históricos, claro. Mas eles não existiram sempre. O arquivo histórico surgem na Idade Moderna criados por um grupo social, os eruditos, para uma função: colecionar raridades.
Sua função já explica muito do método de análise utilizado pelos eruditos: a análise quantitativa e restrita á certos tipos de fontes. Todo saber está ligado á uma instituição. No nosso caso, a História esteve ligada aos arquivos e á academia. Os arquivos são mais importantes no momento porque eles eram a base da pesquisa e, por isso, a base do saber histórico. Hoje o computador pode substituir os arquivos, pois ele pode reunir uma quantidade incrível de documentos em série. Voltaríamos á velha análise quantitativa? Certeau acha que não. Com o computador, a enumeração das fontes será mais eficiente e com isso poderemos enxergar não a quantidade, mas o sentido das fontes. As fontes, assim, se explicam por si só.

O alvo do historiador, não é mais a totalidade, mas o desvio. Significa que através desse trabalho de separação e enumeração de fontes que o computador faz, o historiador deve procurar aquilo que se sobressai. Aquilo que fica fora do comum. Por exemplo, um massacre de gatos numa oficina de tipógrafos na França pré-industrial ou um moleiro italiano que tem idéias interessantes sobre a Criação sendo avaliado pela Inquisição. O historiador não tenta mais dar sentido á História, mas a achar os seus desvios.
Isso muda até o status que a História tem perante as outras ciências. Ela passa a ser um laboratório para as teorias criadas em outras disciplinas, como a Sociologia ou a Economia. O historiador faz sua pesquisa, acha o desvio e vê se determinada teoria não é descartada por causa dele. A História vira o campo do particular.
No meio de tantas mudanças, algo continuou: o status crítico. Ela desperta uma consciência do presente. Sabendo das origens do mundo moderno podemos compreender melhor a atualidade. Mas a História vive na corda bamba: ela historiciza o presente e presentifica o passado. O passado é sempre explicado pelo presente, assim como o presente é explicado pelo passado. Nunca veremos esses dois como eles realmente são, mas como eles são representados por nós em determinado momento.
Para resumir, Certeau acredita que as técnicas definem uma ciência. No caso da História hoje, graças ao computador e interpretações epistemológicas, as técnicas construíram uma ciência destinada ao singular e á consciência crítica, sem nunca nos esquecermos que ela também serve aos propósitos de seu grupo social (os acadêmicos).

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Águas de Setembro

Memorial do 11 de Setembro
Domingo os atentados ás Torres Gêmeas e ao Pentágono completaram dez anos.
Muita coisa mudou em dez anos. Primeiro, o terrorismo, que já é figura antiga, mudou de cara. Colocou o turbante do fundamentalismo islâmico. Segundo, vários mitos cairam: a invulnerabilidade dos EUA foi por água á baixo; a idéia que muita gente nutria de que a história havia chegado ao fim com o término da Guerra Fria então nem se fala.
É verdade que depois do 11 de Setembro, os EUA ficaram mais paranóicos que antes e seu sistema de segurança se tornou quase uma camisa-de-força, mas aquela imagem de país altivo, polícia do mundo, que foi conquistada no século XX tinha sido abalada. E seria abalada de novo, mas na economia nas crises de 2005 e 2008. E continua abalada ainda hoje com a crise do dólar.

Francis Fukuyama, cientista político norte-americano.
Um sujeito chamado Francis Fukuyama escreveu um artigo na década de 1990 dizendo que aquele era o fim da História, porque com o fim da Guerra Fria, não haveria mais nenhum movimento social importante. O neoliberalismo era o melhor dos mundos, todo mundo estava feliz, a globalização está aí pra unir as pessoas, etc. Muita coisa ocorreu depois do artigo de Fukuyama, mas de todas, 11 de Setembro foi um soco na fuça das teorias que queriam enterrar a História.
Por um lado, novas teorias mais inconvenientes ainda foram adotadas. Samuel Huntington, ainda nos anos 90, dizia que após a Guerra Fria o mundo entrava em uma nova era: as guerras não seriam mais ideológicas (capitalismo x comunismo), mas culturais (Ocidente x Oriente). Quando descobriram que a Al Qaeda estava por trás dos ataques, muitos viram Huntington como um profeta. O problema é que essa teoria esquece que os conflitos no Oriente Médio não são só culturais, mas políticos e econômicos, como sempre foram (ou o petróleo e os ditadores árabes não tem nada a ver com essa história?) - sobre o Oriente Médio de ontem e de hoje, ver aqui.

Liberdade, escrita em árabe e inglês.
Dez anos depois, o Oriente Médio tá na boca de todo mundo de novo, mas de uma forma diferente. Não se fala mais em guerra e terrorismo, o Oriente Médio não parece mais ter a cara do Osama Bin Laden ou do Mubarak, mas várias caras. Não se sabe ainda pra onde ele vai, o que se sabe é que ele está se rearranjando com suas próprias pernas (até um certo ponto, claro). E seja para onde for, não vai ser mais como antes.
Barak Obama
Dez anos depois, um presidente negro ocupa a Casa Branca. Obama foi eleito justamente pela esperança de que os americanos tinham no novo. Depois de confiarem num presidente conservador que mandou seus filhos para uma guerra não para se vingar dos atentados, mas para conseguir petróleo, os americanos decidiram partir para algo novo. Acabou que Obama não foi uma mudança tão radical assim: o desemprego continua e a crise econômica também. Só a política exterior mudou um pouco. Obama é um falso brilhante? Em parte, sim, muitas de suas promessas foram mera politicagem. Por outro lado, outras ele realmente queria fazer e não conseguiu graças ao Congresso (a maioria pertence á oposição) que barra todas as medidas.
O conservadorismo parece um fantasma que nunca desaparece. Em muitos momentos, o próprio EUA se aproximou muito dos governos fundamentalistas que tanto desaprovam. Os debates acalorados e os comentários apelativos dos articulistas de muitos meios de comunicação indiretamente foram responsáveis por quebra-quebras e até uma tentativa de assassinato de uma senadora. E o que dizer do buylling que gerou massacres não só nos EUA, mas na Noruega, Finlândia, etc?

Perfil na rede social Facebook de Anders Breivik, atirador norueguês que fez um atentado na primeira metade desse ano.
Se formos avaliar bem, essa década foi palco de mudanças cada vez mais repentinas e nem tão promissoras assim. Me arrisco a dizer que as forças ocultas tem sido os grandes protagonistas nesses dez anos. Por forças ocultas não me refiro á sociedades secretas malignas ou entidades demoníacas (como tantas teorias da conspiração teimam em ver por trás de todas as mudanças), mas á organizações que agem nas sombras como grupos terroristas, cartéis e até agências de anti-terrorismo. São ocultas porque a maioria de seus membros são anônimos ou se escondem sob mil identidades e utilizam os mais variados métodos para atingir seus fins. A Al Qaeda tinha um rosto: Osama Bin Laden. Os EUA tinham a esperança de ao matá-lo poderem desnorteá-la, no entanto, parece que ela se utiliza disso para parecer mais assustadora ainda. Como neutralizar um inimigo que não tem face, que pode ser qualquer um? É tentando responder essa pergunta que muitas organizações contra o terrorismo tomaram medidas que por vezes quebraram o direito á liberdade e á privacidade de muita gente.
Tenho um amigo que á cada notícia de um novo avanço científico se petrifica de medo. O raciocínio dele é o seguinte: esse troço que descobriram ou que fizeram será mais cedo ou mais tarde usado contra nós! Daí que ele tem pesadelos com a engenharia genética e a nanotecnologia. E não duvido que se elas caírem nas mãos de terroristas, bandidos ou pessoas ambiciosas seus sonhos se tornarão realidade. Segundo o filósofo polonês Zygmunt Bauman vivemos num mundo onde tudo é líquido (no sentido de ser fugidio, efêmero) até o medo. O medo que temos hoje do terrorismo já não é o mesmo medo de amanhã, que pode ser sobre a violência nas grandes cidades, epidemias descontroladas ou tragédias naturais, depende do que a correnteza nos trouxer.
Enfim, isso tudo são apenas algumas lembranças e reflexões que as águas de setembro podem nos trazer.

sábado, 10 de setembro de 2011

Manaus nos anos 60 (e outros assuntos)

Como era gostosa a utopia!
A política estava em tudo. Cultura e política.
A Manaus daquela época não vivia mais a mitologia dos tempos da borracha, com a história de acender o charuto em nota de cem mil réis. O papo de "ouro negro" já era; os arrivsitas mais espertos já haviam abandonado a região apressadamente. Ficaram os que não puderam sair e mais aqueles que optaram por ficar. Manaus, nestes anos sessenta, até meados da década, foi uma cidade morna e provinciana, esquecida no coração da floresta amazônica.
Nouvelle Vague, Cinema Nova, Neo Realismo, Índio, Maconha, Sartre, Juventude Transviada. Tentativas de fugir da inocência, da desinformação, do isolamento. Signos da modernidade.
Pensava-se até mesmo em libertar a Amazônia do Brasil e fazer uma República Socialista. A senha era esta: "O Uirapuru está cantando". Outra utopia, como outras, até com raízes históricas, pois a Amazônia nos duzentos anos que precederam a Independência, sempre manteve relações diretas com Portugal. Na realidade, o Grão-Pará era uma espécie de Vice-Reinado. A notícia da Independência só chegou lá para os meus bisavós mais de um ano depois. E não foi só uma mera questão de distância, mas de resistência em relação á Independência. Lusitanismo e nativismo em permanente tensão. A Cabanagem como outro signo de revolução.


Narciso Júlio Freire Lobo, jornalista e poeta amazonense, no livro A Tônica da Descontinuidade: Cinema e Política em Manaus nos Anos 60. Manaus: Editora da Universidade do Amazonas, 1994. p. 11.

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

A Operação Historiográfica II

Todo historiador está limitado por circunstâncias, por exemplo o tempo em que viveu e a classe social á que pertence. Essa última é um dos aspectos destacados por Michel de Certeau para se compreender como o trabalho historiográfico é produzido.
Como sabemos, nos primórdios das ciências acreditava-se que a imparcialidade podia ser alcançada. Esse mito foi levado das Ciências Naturais para as Ciências Sociais pelo positivismo. Aqueles eram os tempos da ingenuidade, quando se acreditava que o pesquisador era invulnerável á sua profissão ou á sua família ou mesmo ao seu posicionamento político. Hoje, depois da crítica do cientificismo, chegamos ao tempo da desconfiança.

Certeau lembra que o sociólogo francês Raymond Aron foi um dos primeiros a criticar a imparcialidade e o isolamento dos historiadores e a propor, ao invés disso, a relatividade histórica - ou seja, tudo é histórico e tudo é social. O problema é que ele enxerga os intelectuais como um grupo bem definido que vive junto com a sociedade, não enxerga a sociedade intervindo nele.
Quem vê essa ação é Michel Foucault. É ele quem cria uma fórmula para se entender a epistemologia das ciências: toda disciplina deve ser entendida levando em conta as técnicas que utiliza e os conflitos sociais que se inserem nela. Certeau usará essa fórmula e acrescenta ainda um terceiro ponto: a escrita.

Um esclarecimento: o lugar social ao qual o autor se refere no começo do capítulo não se trata apenas da origem do pesquisador, mas da sua própria profissão (estamos falando do historiador, do pesquisador profissional). Portanto, passemos á falar da formação das "instituições de saber", o lar dos pesquisadores. Essas instituições foram criadas no começo da Idade Moderna e para construir uma linguagem própria, científica, procurou se afastar da política e da religião. Esse movimento é conhecido como as "despolitização dos sábios". É esse movimento que cria o mito da neutralidade e da objetividade.


Michel Foucault

Raymond Aron

As instituições científicas não estão flutuando sobre a cabeça da sociedade, elas estão ali, bem no olho do furacão, por mais que tenham negado isso. Muitas vezes a ciência legitima a sociedade em que está inserida. Ela pode agir, portanto, como uma engrenagem. Ora as próprias questões que ela busca responder demonstram isso. Exemplos: entre a Primeira e a Segunda Guerra Mundial, a histórica econômica teve um boom, principalmente com a crise de 1929. Coincidência? A história cultural se tornou muito prestigiada a partir dos anos 90 quando surge a idéia de globalização. Será que não tem nada a ver?

Tem tudo a ver! Na história essa ligação com a sociedade é mais forte ainda, porque o conhecimento histórico é movido pelos questionamentos da sociedade e ele confere sentido ás classes sociais que pertencem á ela. Nenhum trabalho historiográfico está sozinho. Historiografia é um conjunto de vários trabalhos, todos eles partem de problemas atuais. A História ajuda a criar uma consciência de classe apresentando as origens e os trajetos das classes sociais. Portanto, não tem como escapar da sociedade.


O que é interessante, segundo Certeau, é que hoje as universidades, as instituições de saber, não procuram mais cientificizar tudo, como antes, mas apenas defender seu posto. Defender uma autonomia que ela não possui. E é nessa situação que surge, segundo o autor, o não-dito. Não-dito pode ser entendido como tudo aquilo que é escondido nos textos historiográficos. Uma ideologia, um preconceito, uma falha, tudo isso pode ser um não-dito. Mas Certeau se refere especialmente á intenção ideológica escondida, á uma ação que não condiz com a teoria ou á um lugar social eliminado do texto. Penso que Foucault com isso esteja criticando as universidades de sua época, que mesmo já estando ciente de que não eram autonômas, teimam em parecer círcuitos fechados.



Ainda sobre o 7 de Setembro

Ontem na sala de aula, discutimos o sentido que o Sete de Setembro adquiriu em nossos tempos.
A data simboliza a nossa independência em relação á Portugal, por isso é tomada como data de nascimento do Brasil enquanto Estado nacional. É uma data cívica, portanto.
O que consideramos como civismo? Referimo-nos á civismo como um conjunto de práticas que versem sobre nosso sentimento de patriotismo, de pertencer á uma nação.
Acontece que o civismo foi utilizado como ideologia, principalmente no século XX. Com isso achamos que civismo ou patriotismo se resume á uma série de práticas. A marcha, por exemplo.
Quem inaugura os desfiles de Sete de Setembro como conhecemos hoje? Getúlio Vargas na década de 1930, como forma de taxar seu governo de nacionalista e esconder suas ações autoritárias.Quem reatualiza essa prática? Os governos militares.
O desfile pelo desfile, ou seja, o desfile como um fim em si mesmo, acaba com o civismo. Poderíamos estar fazendo coisas muito mais úteis e pontuais por nosso país. Poderíamos fazer algo para pressionar o governo, para acabar com a corrupção, por exemplo. Nesse sentido acho o Grito dos Excluídos, um evento que ocorre em todo país promovido pela CNBB e diversos movimentos sociais para exigir uma política menos corrupta e condições de vida melhores, uma alternativa interessante para se comemorar a Semana da Pátria.
Esse ano, o Grito dos Excluídos ocorreu em Manaus na Avenida Constantino Nery e reuniu 3 mil pessoas. As exigências feitas foram com relação ás mudanças que a Copa de 2014 podem acarretar para a cidade. A intenção não é impedi-las, mas alertar sobre os riscos ao meio ambiente e á sociedade local se elas não forem executadas com cuidado.
Isso é interessante porque demonstra que o civismo é uma estrada de mão dupla. Afinal, o princípio da cidadania é de que o cidadão tem direitos e deveres. E o princípio da soberania de uma nação é de que ela reside em seu povo, no seu conjunto de cidadãos. O que lamento é que exercitamos nosso direitos e deveres apenas em ocasiões especiais ou muito raras, mas exercitá-los já é um grande passo.

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

A Operação Historiográfica I

"O que fabrica o historiador quando 'faz história'? Para quem trabalha? Que produz?" Essas são as perguntas que abrem o interessante capítulo A Operação Historiográfica do livro A Escrita da História de Michel de Certeau. Esse é um texto quase que obrigatório á todo aquele estudioso da historiografia. Analisaremos aqui nos próximos posts as reflexões propostas por Certeau.

Primeiro, falemos um pouco sobre o autor: Michel de Certeau (1925-1986) era um intelectual francês de formação muito eclética. Se graudou em Filosofia, ingressou na Companhia de Jesus e obteve doutoramento em Teologia. Já participava dos círculos intelectuais de Paris desde a década de 1950, mas só alcança destaque com artigos sobre o movimento estudantil de Maio de 1968. Simpatiza com os filósofos e historiadores que surgiram na década de 1970 na França que fizeram uma crítica á neutralidade de ciência, como Michel Foucault e Paul Veyne, dentre outros. Os campos de Certeau eram basicamente a História, a Psicanálise e a Sociologia. No livro em questão, A Escrita da História, há sempre um quê de Psicanálise em suas proposições. Por exemplo, quando diz que o historiador também interage com o Outro (entidade psicológica diferente do Eu, externa á ele), seja ele na forma do passado, do leitor ou da própria morte.
[Para mais informações sobre o pensamento de Certeau, dê uma olhadinha aqui]
Vamos ao capítulo propriamente dito: aqui Certeau expõe sua tese de que todo estudo de história é condicionado por três esferas, além do contexto em que foi criado. Que esferas são essas? O lugar social onde o historiador está inserido, as práticas científicas de que dispõem e o modo como apresenta o resultado de sua pesquisa (a escrita).
Estas esferas serão abordadas no decorrer desse capítulo guiadas sempre pela percepção historicista (no sentido de reconhecer que todas elas estão sujeitas ao devir histórico) e psicanalítica (sempre antenada na relação entre o conhecimento histórico e o Outro) de Certeau. Ao final, o filósofo acaba por fazer um exercício de epistemologia muito interessante e muito original. Veremos uma por uma essas esferas aqui.

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

7 de Setembro

Estava pensando: o que escrever sobre o 7 de Setembro além do que já escrevi aqui? Como falar dele sem cair no clichê ou na indiferença?
A minha tentativa de fazer algo novo sobre essa data veio na forma dessa crônica:

Deitada eternamente em berço esplêndido...

7 de Setembro. Esse dia me traz algumas lembranças.

Vejo os desfiles que fazia quando era um garoto magricelo e dentuço.

Como odiava aquilo tudo! O calor, a repetição... Só o fato de ser obrigatório já me enchia o saco.

Alguns até se orgulhavam de carregar a bandeira ou desfilar na frente. Eu não. Não queria nem estar ali.

Hoje vejo que os desfiles não mudaram muito. Quando olho para as crianças desfilando dá para perceber que a maioria queria estar em outro lugar fazendo outra coisa, qualquer coisa menos desfilando no 7 de Setembro.

Eu cresci. Compreendi o que é realmente pertencer a um país. Respeito a bandeira, mas sei que sou um dos poucos. Brasileiro só se torna patriota de quatro em quatro anos com a Copa do Mundo.

No entanto, ultimamente os jogos da Seleção nos envergonham mais ainda. Os jogos e tudo. A corrupção, a violência, o preconceito, tudo isso. Não sei como nossa bandeira continua a flamular depois de tantas vergonhas. No lugar dela eu me encolheria e esperaria o tempo passar, mas ela é teimosa. Não fosse seu amigo vento estaria perdida.

Dizendo isso tudo posso passar a impressão de que sou um Policarpo Quaresma, mas sou apenas um cara contente por ter nascido aqui. A gente tem uma ligação com nossa terra, é algo meio inexplicável. Num primeiro momento nem ligamos, mas depois ela passa a ser, assim, um de nossos portos afetivos. É o que sinto pelo Brasil.

Vendo isso tudo acontecer me envergonho. Me envergonho muito mais pela nossa reação passiva do que pelos problemas propriamente ditos. Um jornalista espanhol disse há um tempo: "Que país é esse que consegue mobilizar milhões em passeatas á favor da maconha e não consegue resolver o problema da corrupção?" Não só da corrupção, como também da educação. Falta essa visão de todo, de que todos os problemas estão ligados, e essa mobilização.

Quem sabe um dia conseguiremos sacudir a poeira e dar a volta por cima. Até lá o 7 de Setembro continuará a me trazer amargas lembranças e alguns desgostos.

O Último Duelo de Medauar

Hoje, deixo com vocês um curto e forte poema do escritor baiano Jorge Medauar.

Último Duelo
Jorge Meaduar (1918-2003)

 Nesta noite, luto
com minhas sombras
e vou partindo, elo por elo,
todos os fios que me ligam á vida
no meu último duelo.


A Mulher na Janela, Salvador Dali.

Jorge Medauar

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Amazonas X Pará

Estátua de Tenreiro Aranha, primeiro presidente da Província do Amazonas, na Praça da Saudade.
Na segunda, dia 5 de Setembro, comemorou-se a criação da Província do Amazonas. Como já falamos da construção da província em outro post, gostaria de falar aqui hoje sobre alguns movimentos que anteciparam esse acontecimento.
Antes de se tornar independente era apenas uma comarca da Província do Pará (até 1833 foi chamada de Comarca do Rio Negro, depois passou a ser conhecida como Comarca do Alto Amazonas), mas já havia o desejo de se emancipar do Pará, seja por conta dos pesados impostos sobre os produtos levados ao porto de Belém ou pela falta de representação política que os locais possuíam.
D. Romualdo de Seixas, bispo e deputado paraense, já manifestava a defesa da independência da Comarca. Acreditava que o Pará teria que administrar uma jurisdição muito grande e problemática e o melhor seria mesmo a autonomia. Os ânimos se exaltaram quando o presidente da Província nomeou um comandante militar para fiscalizar a Comarca com rigor e concedeu poderes á Câmara de Barcelos, transferindo-a para o Lugar da Barra do Rio Negro em 1825. Tudo parecia levava á uma menor participação da elite local nos rumos da sua região.

O novo presidente da Província tentou apaziguar os ânimos retornando á Barcelos sua Câmara e destituindo o comandante militar que nomeou para comandar a Comarca. Em 12 de abril de 1832 ocorre um levante militar na Barra do Rio Negro por conta de uma rebelião da tropa que guarnecia a Comarca. Os soldados protestavam contra a falta de pagamento, o comandante militar coronel João Felipe dos Reis tenta puni-los e acaba sendo morto. O coronel Felipe dos Reis era um dos poucos representantes do governo que não era simpático á autonomia da comarca. Uma vez fora de cena, os políticos locais tomam o poder: Manoel Bernardino de Souza e Figueiredo, ouvidor, é proclamado o presidente provisório da nova Província enquanto o frei José dos Inocentes é escolhido para ser o representante dela na Corte.
Acontece que ao saberem da revolta, as forças legalistas, com medo dessa ser uma das tantas revoltas separatistas do período Regencial, manda suas tropas para reprimir o movimento.  Em 10 de agosto, a Comarca é tomada. Frei José dos Inocentes ainda estava em viagem para o Rio de Janeiro quando tudo isto aconteceu. Ele foi detido na Província do Mato Grosso e retornou ao Rio Negro em 1833.
Ao contrário do que as autoridades pensavam, esse não era um movimento separatista como o foi a Farroupilha no Sul do Brasil. Seus líderes apenas queriam autonomia do Pará e não do Brasil. Outro movimento aconteceria anos depois, esse muito mais radical: a Cabanagem.
A Cabanagem chega no Amazonas em 1836 e tem como líderes Bernardo Sena e o Capitão Antônio Freire Taqueirinha. Os cabanos tomam as vilas próximas de Manaus, como Luséia e Serpa. Só em 6 de março de 1836 que tomam Manaus e assim criam uma espécie de posto para as futuras expedições no Alto Amazonas. Os cabanos passaram a lutar entre si, Sena e Taqueirinha entram em conflito e o primeiro acaba sendo assassinado. Desestruturados, as forças legalistas conseguem atingir Manaus no dia 31 de agosto. Claro, que os revoltosos continuaram lutando pelo interior até meados de 1840. O curioso é que durante o domínio cabano, a Câmara de Manaus chegou a discutir a emancipação do Pará.

Porto de Belém do Pará
Como podemos ver, o desejo de se tornar independente do Pará não nasceu na década de 1850. E mais interessante ainda é que mesmo emancipado o Amazonas continuou dependendo do Pará para escoar seus produtos. A rixa entre os dois Estados perdurou por anos e um dos episódios mais interessantes dela é a anexação do Acre: o governo amazonense, através de Ramalho Cardoso Júnior, incentivava a independência da região em relação á Bolívia com o interesse de anexá-la a seu Estado, assim o Amazonas teria uma das zonas mais produtivas de seringueiras da região, superando a produção do Pará. Na discussão, o governo federal acabou ajudando o Pará ao transformar o território do Acre em mais uma unidade federal e não parte do Amazonas. Talvez nessa ânsia pela autonomia esteja a origem da rivalidade entre amazonenses e paraenses.

sábado, 3 de setembro de 2011

Uma sugestão muito conveniente

Arthur Cézar Ferreira Reis em seu livro A Amazônia e a Cobiça Internacional (1968) nos relata um episódio curioso: o interesse da Inglaterra pelo Pará nos tempos da Cabanagem.
A revolta que explodiu no Pará e no Amazonas durante a Regência durou cinco anos. Em 7 de janeiro de 1835, os cabanos tomam o poder em Belém, tendo os irmãos Vinagre á frente do governo. A cidade foi recapturada pelas forças legalistas, mas em 14 de agosto do mesmo ano cai de novo nas mãos dos cabano, sendo escolhido para governá-la o jovem cearense Eduardo Angelim.

Eduardo Angelim
Pois bem, durante o governo de Angelim o clima de instabilidade ainda era grande. Um navio inglês chamado Clio, fundeado em Salinas, trazendo armas para o Comandante Lobo de Souza, o líder das forças legalistas, teve sua tripulação morta e seu carregamento roubado. Acredita-se que o comandante do navio, á procura de um prático, tenha escolhido para o cargo um norte-americano que já vivia aqui, John Priest. Ao saber do conteúdo do navio ele teria contado aos seus amigos e planejado o saque.

Belém do Pará em desenho de Spiux.
Por causa da instabilidade, não foi possível achar Priest e seus cúmplices. No dia 17 de março de 1836 chegam á Baía de Guajará três belonaves inglesas comandadas pelo Capitão B. Strong. Este manda um ofício á Angelim pedindo que os criminosos sejam punidos, que a Inglaterra seja indenizada pelo seu governo e que, em sinal de luto á tripulação morta, a bandeira britânica seja içada acima da brasileira.
Angelim, assim que traduziu o ofício se reuniu com seus conselheiros e escreveu a sua resposta. No ofício mandado á Strong, Angelim diz que por causa da desordem reinante na província eles ainda não acharam os responsáveis, mas assim que tudo se acalmar os acharia e os puniria. Quanto á indenização, o governo do Brasil que deve arcar com ela, visto que o Pará pertence á ele. Sobre a bandeira, isso será feito.
Até aqui a história está mais para um desentendimento internacional que alguma forma de conspiração imperialista estrangeira. É quando Angelim convida os oficiais ingleses para um almoço que a história muda de rumo. Segundo Domingos Rayol que chegou a entrevistar Angelim para escrever seu livro sobre a Cabanagem, Motins Políticos, em determinada hora um oficial britânico deu a idéia: o Pará poderia se declarar independente e a Inglaterra o reconheceria como país. Angelim descarta a sugestão, dizendo que prefere continuar brasileiro.
Quando as forças legalistas depõem o governo cabano, Angelim alega que fez tudo pelo Brasil e que podia ter facilmente cedido ás sugestões separatistas que lhe foram feitas por estrangeiros mais de uma vez. Arthur Reis se pergunta quem seriam esses estrangeiros. Diplomatas? Militares? Viajantes?
A Inglaterra, que até então mantinha ótimas relações com o Império brasileiro, não hesitou em aproveitar a oportunidade de poder se tornar credora de mais um país quando percebeu que as províncias do Norte estavam insatisfeitas com o governo e tinham alguns pensamentos separatistas. Percebam: o navio saqueado chegou á região justamente para ajudar as forças legalistas, no entanto os oficiais que chegaram depois para cobrar justiça acabam por se aliar ao governo dos revoltosos, inclusive dando "sugestões" muito convenientes (para os britânicos, claro).
Esse capítulo, assim como todo o livro de Arthur Reis demonstram que o interesse pela Amazônia já é antigo e se manifesta das mais diferentes formas. Se antes se pretendia ocupar militarmente a região, depois pretende dominá-la diplomaticamente e, como acontece muito hoje, financeiramente.