domingo, 18 de novembro de 2012

História hoje


A História no século XIX era centrada na narrativa, privilegiava o aspecto político e factual e tinha um sentido evolucionista, onde o Progresso era tido como o motor da História. Já no século XX, o historiador italiano Arnaldo Momigliano enxerga um painel radicalmente diferente: a História não é mais dominada pela narrativa, os fatos e a política. Agora, se fala em "forças sociais" e não em Progresso.
É inegável que o Positivismo tenha inúmeros defeitos, mas ele também tem seus méritos. Um deles é o de transformar a História em uma ciência. Essa é uma contribuição enorme, porque ajudou a amadurecer os estudos históricos. O grande nome nesse momento é Leopold von Ranke que ao pregar a urgência de se fazer uma "história tal como aconteceu" renegava assim a especulação exagerada que muitos escritores faziam quando se tratava de falar de História. Ao mesmo tempo, essa atitude tornou a escrita da História da Escola Metódica um pouco paranoica com qualquer tipo de reflexão. Assim, os seguidores de Ranke afunilaram seu trabalho na pesquisa e descrição dos dados coletados.

Momigliano nos fala de um momento posterior ao declínio do poder dessa concepção de História. As duas interpretações contrárias ao Positivismo que existiam no século XIX, o Historicismo e o Marxismo, também amadureceram e conquistaram maior espaço no século seguinte. Além disso, tentando conciliar as propostas de uma História interpretativa e ampla com a legitimação da História enquanto ciência, que até então era obra dos positivistas e rankeanos, surge o movimento da Escola dos Annales. Assim, na década de 1950 (momento em que o historiador italiano nos escreve), os nomes de Marc Bloch, Lucien Febvre, Gyorg Lukács e Benedetto Croce, dentre outros, já figuram como pioneiros numa nova concepção de História.
Se os positivistas tornaram a História uma ciência, os historicistas, marxistas e membros dos Annales a transformaram em uma ciência social. Ora, o modelo de ciência que se tinha no século XIX era o das ciências naturais. A História, por seu caráter residual e social, se sentia engessada nesses moldes. Os movimentos que abrocham na virada do século, no entanto, tentam encontrar um paradigma mais humano, mais passível de compreender melhor a complexidade do trabalho do historiador, e cada um a sua maneira ajuda a construí-lo.

Ora, os historicistas relativizam os sentidos da História e discutem a questão da subjetividade com muita propriedade, dando uma contribuição enorme ao campo da Historiografia em específico. A Escola dos Annales nasce com a bandeira da interdisciplinaridade e História-problema, ajudando a revitalizar o caldo conceitual de que os historiadores se valiam e repensando a metodologia da pesquisa. Os marxistas (os mais coerentes, não os "marxistas vulgares" de que tanto Hobsbawm fala) trouxeram á discussão uma concepção da História e um método que tentam captar a complexidade da sociedade e como ela muda. Estamos falando da visão da sociedade em níveis hierarquizados (base, superestrutura, etc.) e a análise das contradições internas (sejam elas de classes ou não) desse sistema por meio do materialismo dialético.
Claro, essas três correntes se assemelham em alguns pontos e discordam em outros. O historicismo, por exemplo, é contrário á uma História total, proposta tanto do marxismo como dos Annales, porque não enxerga a História como um processo que tenha uma direção determinada.

Nas décadas finais do século XX, essas diferenças serão muito mais explícitas. A virada antropológica, o renascimento da narrativa e a recusa de um sentido á História fortalecem mais o viés historicista, que como tudo, mudou também no decorrer dos anos. O foco na linguagem (na análise da cultura e do discurso, por exemplo) se tornou tão popular por englobar a cultura e o indivíduo, conceitos que perdiam espaço em interpretações mais estruturais. Hoje a História está tão ligada á linguagem que há quem diga que ela não passe de narrativa também (como Hayden White).
Se cada corrente deu sua contribuição, qual o mérito dos pós-modernos? Acredito que eles tenham aprofundado as discussões da geração anterior: a subjetividade, em maior medida, hoje é considerada um fator de fundamental importância nos estudos históricos e faz-se uso de conceitos vindos de outras ciências em larga escala. Apenas é renegada a concepção de História Total, por não contemplar a diversidade. Até a visão social hoje, após os atritos iniciais entre pós-modernos e marxistas, é debatida e reaproveitada.
Hoje a História é mais que nunca uma ciência social, que sabe o lugar que ocupa na sociedade.

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