quinta-feira, 28 de abril de 2011

Questões levantadas por um marcador

Quando criei o marcador "cultura" nesse blog acabei entrando em um dilema espinhoso: como classificar o que é cultura e o que não é cultura dentro dos posts que faço? Ora, religião e política podem ser encarados como parte de uma cultura. Esse dilema desemboca numa questão muito maior: o que é cultura?

Cultura é um desses termos que carece de uma definição "definitiva", por assim dizer. Muitos ainda discordam sobre o que podemos considerar como cultura. Os maiores responsáveis por levantar dados sobre cultura e por se debruçar numa definição são os antropólogos, então recorramos á eles:
Ruth Benedict diz que a cultura é como um óculos, através de suas lentes enxergamos o mundo de uma maneira diferente de acordo com a lente usada.
Já Darcy Ribeiro considera como cultura a reunião de todos os bens de uma sociedade, sejam eles materiais ou simbólicos.
Marshal Sahlins acredita que a cultura é um campo da sociedade onde estão todos os códigos de ação de seus membros, sendo estes códigos mutáveis, históricos.

Importante ressaltarmos que antes da antropologia se tornar o campo privilegiado da cultura, era comum pensarmos cultura como o conjunto de valores e símbolos (Kultur, na Alemanha, por exemplo) ou como a reunião das realizações materiais (Civilization, na França). E se enraizou em nossa mente uma idéia romântica de cultura como algo imutável, o espírito de um povo (na verdade, isso é um discurso presente na construção de qualquer Estado nacional).
Para nos ajudar vamos nos sustentar em alguns pontos defendidos pelo antropólogo Roque de Barros Laraia no seu livro clássico Cultura: um conceito antropológico. Segundo Laraia, todos concordam atualmente que:
-A cultura condiciona o aspecto biológico e geográfico de nossas vidas, basta nos lembrarmos das deformações infligidas em muitos povos nos seus corpos e as obras cosntruídas para superar as barreiras físicas do relevo. Isso é até importante para atacar duas concepções que dominavam a cabeça dos cientistas do século XIX e XX: os determinismo biológico (raça) e geográfico (clima).
-A cultura possui uma dinâmica, ela não é estática; pode mudar com as gerações ou com o contato com outra cultura, por exemplo.
-A cultura tem uma lógica própria, por isso não podemos tentar entender uma cultura usando a nossa como padrão: a nossa cultura tem uma lógica e as outras tem a sua também. Fazer isso é ser etnocêntrico. A fórmula utilizada pelos antropólogos para pesquisar outros povos é o relativismo, tentar se desprender de nossos valores e adotar o dos outros povos.

Os antropólogos andam discutindo sobre cultura desde a década de 1920 mais ou menos, através da figura lendária de Franz Boa em grande parte. Na metade dos anos 60 na Inglaterra, por sua vez, uma série de estudos sobre cultura foi produzido por pensadores marxistas com uma visão mais crítica dos processos históricos; estes se dedicavam a falar da cultura e não somente da economia e lembravam que a cultura também é um campo de relações sociais (de dominação e resistência, por exemplo). Antes deles, no entanto, houve a Escola de Frankfurt, um grupo de marxistas não-ortodoxos que se dedicaram a analisar a arte e a cultura dentro do capitalismo. Atualmente, podemos encontrar um grupo que se autodenomina de culturalistas e que recolhem a contribuição de todos esses pensadores. Existem em alguns lugares a disciplina Estudos Culturais. Aliás, cultura é um conceito cada vez mais político: com a globalização e o neoliberalismo, é frequente hoje vermos muitos intelectuais e até comunidades utilizando o conceito de cultura como uma espécie de bandeira contra esses dois processos.

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