quinta-feira, 3 de março de 2011

Moacyr Scliar

Faleceu á dois dias atrás, com 73 anos, o escritor Moacyr Scliar.
Quando eu parei de colorir livros e passei a lê-los era raro achar algum autor que me simpatizasse. Na pequena biblioteca municipal da cidade do interior paulista em que eu vivia então haviam muitos livros e eu os escolhia, na época (por favor, sem o sermão do "não julgue o livro pela capa"), por causa de seus títulos.
Assim eu descobri Mário Palmério (Vila dos Confins), José Cândido Carvalho (O Coronel e o Lobisomem), José Lins do Rego (Banguê) e Stanislaw Ponte Preta e Millôr Fernandes, dentre tantos outros autores que adoro até hoje. E Scliar era um deles.

Me lembro que li primeiro uma antologia de contos seus. Citando de cabeça, os que mais gostei eram Cego e Amigo Gedeão na Beira da Estrada, Os Leões, A Pesca e Shazzam! Eram contos surreais e irônicos.Alguns pareciam relatos jornalísticos sobre acontecimentos bizarros enquanto outros tinham um cárater de confissão.
Depois, já interessado pela História, peguei Sonhos Tropicais, onde Scliar nos conta de uma maneira interessante a vida do sanitarista Oswaldo Cruz. Com exceção do começo que achei muito massante, o livro era mágico: ora alucinação ora a realidade crua. Scliar soube muito bem aproveitar os personagens históricos e até os tipos urbanos fazendo uma verdadeira mitologia carioca nesse livro.
De Scliar só tenho dois livros: Sonhos Tropicais (xerocado é claro, mas vá lá!) e A Majestade do Xingu. Este último comprei sem ter lido antes; sabendo do estilo do autor, não haveria decepção. Aqui somos apresentados á outro sanitarista conhecido, Noel Nutels, que constantemente visitava os índios da reserva do Xingu. Novamente, temos uma história paralela (é um amigo de Nutels, ou pelo menos, que pensa ser que conta a história dele e de sua vida) e um elenco de tipos excêntricos aqui.
Vai parecer redundância, mas há muito de Moacyr em sua obra. O que quero dizer é que sua vida era sua inspiração máxima, principalmente duas esferas de sua vida: a sua profissão de médico e sua religião, o judaísmo. Nos poucos livros que li dele, admito, pode se perceber essas duas influências a todo momento: a fé e o cartesianismo, a saúde pública no Brasil, a condição judaica, etc. Desde que despontou como escritor no final dos anos 70, Scliar não pode ser enquadrado em um gênero, não porque ele não tem um ou porque temos poucos gêneros na nossa literatura, mas porque o seu estilo é completamente original.
Lembro de tê-lo visto numa reportagem na TV, no final do ano passado, e ele estava entusiasmadíssimo com a atual situação da literatura em nosso país, com tantos, principalmente jovens, lendo. Scliar era filho de imigrantes russos que se instalaram em Porto Alegre no começo da década de 30, mas mesmo assim sua mãe fazia questão de que seus filhos não fossem analfabetos e com isso estimulou o gosto pela leitura das crianças. Tenho uma coleção já de entrevistas de Scliar sobre livros (algumas até dando dicas de achar um bom sebo) e nelas a gente percebe a paixão desse homem pela literatura. Ele podia até ter dito aquela famosa frase de Lobato: "um país é feito com homens e livros!'
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