Deixo vocês hoje com uma pequena anedota política contada pelo sociólogo Nelson Pesciotta:
O Vale sempre foi patologicamente político. Nas nossas cidades, tudo era motivo para disputas políticas, da eleição da diretoria do clube á da mesa da Santa Casa, da esoclha do paraninfo na escola até a escolha da comissão de festa da Igreja.
o envolvimento dos vigários, então, é um tema fascinante à espera de um bom pesquisador. Seus poderes não eram apenas espirituais, a política os atraía bastante a alguns se envolveram discretamente, enquanto outros tiveram participação bem ativa, chegando a conflitarem até mesmo com alguns fiéis por causa das eleições.
Lembro-me de uma cena que presenciei na década de 30. Eu, menino, acompanhei meu pai numa "visita eleitoral" a um bairro da cidade que agora está próspero e até quer emancipar-se, mas naquele tempo era pequenininho. O horário do "comício" era depois da missa. Chegamos lá quando a missa estava em andamento e entramos na igreja. A caravana era do Partido Constitucionalista, que se opunha ao P.R.P. - Partido Republicano Paulista. O P.C. era o partido do engenheiro Armando Salles de Oliveira e dos Mesquita. Gente fina. E o nosso vigário estava com o P.C.
Chegamos e entramos na igreja. O vigário pregava o evangelho. Não lembro bem o que ele falava quando entramos, mas me recordo, como se isto tivesse acontecido hoje, de uma sua expressão:
-"Esse amaldiçoado P.R.P., com letras deste tamanho..." e fez um gesto com a mão direita esticada á frente, dando uma razoável altura para representar o grande tamanho de tais letras.
Do envolvimento político de tal religioso (cuja vida pessoal ao que consta, era absolutamente ascética, piedosa, caridosa e tudo o mais) constam inúmeras passagens curiosas. Dizem que num bairro distante, naquela famosa eleição de 47, quando o eleitor podia levar consigo as cédulas para votação, teria ele levado as cédulas do seu candidato e dito aos presentes a um ofício religioso:
-"Estas são cédulas sagradas".
Não preciso dizer que seu candidato ganhou e com boa margem...
O bom padre tinha obsessão com o comunismo, isto é, contra o comunismo. Quem o desagradasse na política era comunista e como tal denunciado por ele, que era mestre em mandar telegramas às autoridades com tais "informações". Algumas pessoas tiveram sérias dificuldades por esse motivo.
Certa feita estava ele na casa de um veterinário participando de uma recepção - um almoço, churrasco ou coisa parecida - quando se encontrou com um velho companheiro de bancos escolares, médico na cidade, político militante, pessoa de muita influência, e pergunta a este:
-"Fulano, se o comunismo vencer no Brasil quem vai mandar nesta cidade?"
O interlocutor, mal contendo um sorriso sarcástico e com a voz anasalada, responde incontinente:
-ora, as pessoas que você denunciou assumem o poder imediatamente". Eu, o dono desta casa, mais Fulano... e desfilou nomes.
Resposta que encerrou o diálogo...
Referência:
PESCIOTTA, Nelson. Episódios Pitorescos da Política Vale-Paraibana. In: CHALITA, Gabriel (coord.). Vale do Paraíba: Política e Sociedade. Aparecida: Editora Santuário, 1993. pgs. 58-59.
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Para os interessados na disputa entre o PC e o PRP, temos esse artigo de Carolina Soares Souza que analisa como ambos tentaram se apropriar da memória sobre a Revolta Constitucionalista de 1932. Recomendo.
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