Na segunda-feira, dia 21, o prefeito de Manaus, Amazonino Mendes, foi visitar o bairro de Santa Marta onde ocorreu no final de semana um deslizamento que resultou na morte de duas crianças. Ouvindo os moradores locais, Amazonino começou a pedir para que eles se mudasse, procurassem um lugar seguro para morar. Uma moradora retrucou que não tinha condições e ele respondeu com a frase que tornou-se célebre: "Minha filha, então morra!" Logo depois pergunta de onde ela vem e ao ouvir a resposta ("do Pará"), desabafa com um "Pronto. Tá explicado."
O caso repercutiu por todo o Brasil e, principalmente, na faculdade entre os colegas. A entrevista virou símbolo do desrespeito do prefeito com os moradores de área de risco e do seu preconceito para com os paraenses. Agora, vamos analisar o caso com um pouco mais de precisão.
A situação: as mortes provocadas pelas chuvas são mais um episódio da velha história da má ocupação das cidades e da falta de fiscalização urbana. Amazonino tenta explicar como evitar uma nova tragédia para os moradores, mas esbarra na resposta da moradora de que eles não tem condição de se mudar. Acho que o sociólogo Luiz Nascimento comentou que os moradores que ocupam área de risco o fazem não por opção, mas por falta de opção. Concordo em partes, também existem aqueles que se aproveitam da situação e fazem uma espécie de especulação imobiliária informal, ocupando apenas para vender terrenos. De qualquer forma, a má ocupação é errada.
Quais as causas da má ocupação? Inchaço urbano. A cidade cresce cada dia, pelos mais variados motivos: falta de planejamento familiar e a migração (seja rural ou mesmo de outro estado, como acontece no Amazonas) são os principais. Assim temos uma ocupação desordenada. Solucionar esse problema passa sim, como tentou fazer o prefeito antes de perder a cabeça, por conscientizar a população, mas não pode parar só nisso; tem que vir coordenada com a fiscalização e maior infra-estrutura no interior e no Estado vizinho, se for possível fazer um plano conjunto.
Os personagens: o outro lado da moeda é que o governo tem responsabilidade no problema por não resolvê-lo com fiscalização e terrenos próprios para a habitação disponíveis aos cidadãos. Amazonino, já conhecido da população local pela sua passagem no senado, governo do Estado e prefeitura nos últimos anos, também é conhecido pela população nacional como um dos principais nomes do mapa da corrupção no Amazonas em reportagens feitas anos atrás. Aliás, durante o período em que foi governador do Estado incentivara a imigração para o Amazonas e o desmatamento da floresta como forma de solucionar o inchaço urbano.Pode até ser que ele tenha sentido os efeitos de sua campanha no passado cairem sobre suas costas agora e esteja realmente tentando mudar o problema.
Quanto ás palavras finais do prefeito, está claro que se trata de preconceito. O velho preconceito do amazonense para com seu vizinho do Pará. Embora sua assessoria tente se retratar dizendo que Amazonino se referia aos imigrantes de uma maneira geral, sabemos que o buraco é mais embaixo. Longe de tentar aqui fazer um tratado sociólogico do preconceito amazonense, isso é fruto de uma longa história de submissão ao Pará, politíca e economicamente, durante seus primeiros anos de existência. Mesmo assim, esse preconceito, pelo que conheço da cidade, está sumindo ou se disfarçando muito bem, aflorando somente em situações intensas, como essa. Ainda não sei qual dos casos é, mas é por aí mesmo.
Conclusão: quem está certo aí e quem está errado? Curiosamente, ambos estão certos e errados: a moradora está errada por ocupar uma área de risco, certa por (talvez) não ter opção de moradia; Amazonino está certo tentando conscientizá-la e errado por perder as estribeiras e cair em contradição com suas gestões anteriores e a atual. Ninguém tem culpa da situação estar assim, é algo mais profundo e histórico, algo que vem antes de nascermos, mas está aí, na nossa frente. Estaremos errados em não tentar solucionar a situação, fazermos o possível, entrarmos na luta com força e bom senso.
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