terça-feira, 22 de junho de 2010

Marxismo e Pós-modernidade

"Como superar o marxismo dominante"? Agora vamos encarar a tão temida pergunta.

Acho que em primeiro lugar, qualquer corrente historiográfica ou filosófica que se preze tem que reconhecer os méritos primeiro e depois os defeitos da corrente anterior. Seria o caso dos pós-modernistas analisarem o marxismo, para além da simples crítica.

O marxismo possui ainda um dos melhores instrumentos de apreensão do processo histórico: o materialismo dialético. Além disso, Marx e seus seguidores criaram muitos outros dispositivos indispensáveis para uma análise não-redutiva da história, como faziam muitos dos positivistas. Não é de se estranhar, portanto, que as duas maiores e revolucionárias correntes historiográficas do século XX tenha se inspirado na filosofia marxista: a Escola dos Anais (ou Annales se preferir) e o marxismo inglês. Conceitos como o de longa, média e curta duração, desenvolvido e utilizado por Fernand Braudel, tem sua inspiração maior no marxismo. Além disso, a corrente marxista inglesa foi responsável por uma reavaliação crítica da filosofia e da historiografia marxista (numa época em que ela se tornava mais e mais dogmática) que gerou conceitos que são utilizados até hoje, a maioria por pós-modernistas, como o conceito de cultura de Thompson ou de classe social como fruto do contexto histórico, do mesmo historiador.

Como defeito podemos dizer que o marxismo, á medida em que foi ganhando o establishment histórico foi se tornando cada vez mais dogmático e no lugar do marxismo original, uma teoria não-redutiva que reconhecia a complexidade do processo histórico e do homem, surge uma espécie de marxismo contaminado por ideais cientificistas e positivistas, que enxergava o homem como marionete das grandes estruturas históricas, reduzindo sua liberdade, e que via nos grupos sociais categorias monolíticas e homogêneas. Mais uma vez a revitalização veio de seus próprios quadros, com a auto-avaliação e a posição crítica de intelectuais como Thompson, Hobsbawn, e no Brasil, do pioneiro Caio Prado Júnior e de Leandro Konder.
Se o marxismo possui seus méritos e defeitos, todos nós sabemos. Mas quais são os méritos e defeitos dos pós-modernistas? Em primeiro lugar, na problemática da verdade, onde se salientou os esquecidos limites da ciência (a posição de Michel de Certeau de que não é possível atingir a verdade, mas uma parte dela,me parece uma das mais lúcidas e moderadas nesse quesito), em segundo, a volta da afirmação do protagonismo das ações humanas (com a crítica ao estruturalismo nas ciências) e a preocupação em escrever a história dos esquecidos (afinal, essa é uma preocupação também de quem deseja fazer uma história total e de interesse social).
Quanto aos defeitos, ao meu ver, temos o exagero da crítica do discurso científico (que chega a pregar o fim da ciência), da fragmentação das história, do relativismo e da posição crítica para com a modernidade. Estes exageros criam uma história tão dogmática (mesmo não propondo nenhum paradigma) e confusa quanto a dos marxistas criticados por Thompson e Konder.
Uma vez esclarecido o papel das duas correntes, vamos á pergunta? Como superar o marxismo dominante? Bem, se o autor da pergunta encara o marxismo dominante como o marxismo academico unilateral que criticamos então a pergunta é fácil: uma posição crítica por parte dos demais historiadores e dos prórpios marxistas dá cabo desse problema. Se o autor entende como marxismo dominante toda a ideologia marxista, então, a resposta é outra: não há como superar o marxismo, assim como não há como superar os Annales (e mesmo os positivistas se você pensar bem) porque suas contribuições na estruturação da história como campo científico foram importantíssimas. O que se tem á fazer é dialogar com ele e criar uma nova corrente com novas contribuições ao campo histórico.
Aliás, muitos dizem que quem é dominante hoje no país é o pós-modernismo. Precisamos esclarecer mais uma vez o enunciado aqui então:se entendemos como pós-modernismo a fragmentação regional da história então sim, ele é dominante. O que todos reconhecem é que há um embate velado entre marxismo e pós-modernismo atualmente. Nesses termos, o interessante seria formular a seguinte pergunta: como superar o embate dominante? Ou seja, como deixar a polêmica de lado e criar novos procedimentos e novos raios de atuação?
Astor Antônio Diehl, em livro recentemente publicado, critica esse embate velado e propõe um enfrentamento mais sério e lúcido com o pós-modernismo. Prega como meio de realizar esse empreendimento duas ações simultãneas: a autoavaliação e crítica dos historiadores e do campo científico e a dialética entre a tradição historiográfica e as inovações metodológicas. Essa é apenas uma proposta, muitas ainda precisam ser feitas (algumas já foram feitas, embora não foram tão divulgadas) e até lá temos muito o que pensar, avaliar e analisar.

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