1810 é o ano da chegada da Família Real portuguesa ao Brasil, de certo um divisor de águas para a história do país. Para o Vale tal acontecimento representou uma reativação do Caminho Real e uma nova fase para a exportação de seus produtos. Taubaté, por estar situada no Caminho e produzir feijão, farinha e açúcar, adquire um novo status de entreposto, agora como uma das vilas que abastecia a Corte no Rio.
Enquanto isso, uma planta exótica trazida por um aventureiro das Guianas que há algumas décadas tem se expandido do Maranhão até o Espírito Santo chega finalmente ao Rio de Janeiro. É o café. Na época fazia parte das roças, não era nada mais que um produto de subsistência, por causa do clima e do solo desfavoráveis ao seu cultivo na Baixada Fluminense. Mas quando o café é introduzido nas terras férteis, extensas do Vale do Paraíba, de regime pluvial moderado, ele se torna um verdadeiro produto de exportação.
A facilidade para se conseguir terras na região (a maioria ainda não ocupadas ou devolutas), unida a concentração de mão-de-obra escrava usada nos seus engenhos e a infra-estrutura (comércio, roças, tropeiros e caminhos) herdada tanto do ciclo da cana como da mineração ajudaram bastante.
Unem-se ás boas condições do Vale, a necessidade do Brasil, em 1822 independente da Metrópole e já com uma dívida externa enorme graças á idenização que D. Pedro I fez á Portugal e Inglaterra para reconhecerem sua independência, de se reerguer economicamente; a mentalidade (colonial) agro-exportadora; a demanda do produto, glamourizado, na Europa. Celso Furtado demonstra muito bem que no começo do século XIX tudo colabora para a continuidade da atividade agro-exportadora: o Brasil não estava suficientemente grande para atrair mais investidores, não havia mercado nem equipamento para a instalação da indústria nacional (graças á Inglaterra que barrava a exportação de máquinas para cá).
A principal razão para se recorrer a empréstimos após a primeira safra é justamente decorrente da natureza altamente precária da produção do café e da grande especulação financeira em torno de sua comercialização. O cultivo do café no decorrer dos anos enfrentou pouca modificação, continuou do mesmo modo, sem análise química do solo ou máquinas capazes de descascar o grão. Quanto ao segundo ponto, a maior parte dos compradores do produto eram as companhias de comércio estrangeiras que ainda estavam sob o efeito da Lei de Say, bem como da Teoria das Vantagens Comparativas de Ricardo.
Para compensar a baixa produtividade os cafeicultores expandiam mais a área de plantio e contraiam mais empréstimos. No entanto, como o mercado oscilava muito, quase sempre eles ficavam com um grande estoque a mais ou menos. Essa instabilidade do mercado fez com que os fazendeiros recorressem ao Estado, entrando na política principalmente para proteger seus interesses, característica mais peculiar dessa nova classe, como bem salienta Celso Furtado.O governo imperial colaborou com isso ao tentar capturar o apoio dos fazendeiros seja com títulos de nobreza, a última coisa que faltava para regulamentar seu status (um bom exemplo é o grande fazendeiro José Francisco Monteiro que após ter enviado alguns de seus homens para a Guerra do Paraguai recebeu o título de Barão e posteriormente Visconde de Tremembé), ou com a nomeação de muitos deles para gabinetes, como é o caso de Antônio Moreira Barros, fazendeiro que se tornou Conselheiro do Império. Era interessante para o governo seu apoio visto que a formação do Império foi permeada de pequenas insurreições e revoltas regenciais (todo apoio é preciso, afinal) e, principalmente, pelo peso econômico que representavam.
Com o tempo, os fazendeiros ficaram hábeis nesse jogo político, apoiando certas campanhas do governo e, assim, obtendo dele certos recursos para os seus negócios. Foi assim que conseguiram que se construísse uma ferrovia no Vale para melhorar o transporte do café. Embora a empresa que construiu a Estrada de Ferro Central do Brasil fosse estrangeira, foi o governo que concedeu o contrato para a construção da ferrovia e determinou onde eles a construiriam, segundo os desígnios dos cafeicultores.
Não podemos nos esquecer ainda que a lavoura cafeeira se fundamentava no trabalho escravo, portanto, a baixa produtividade também era compensada com a compra e o tráfico, principalmente, de escravos. Com o tempo, as fazendas se tornaram extensíssimas e a população de escrava enorme. Para manter essa população sobre controle, uma vez que ela é fundamental, criaram-se certos dispositivos como o paternalismo e/ ou o autoritarismo.Não podemos nos esquecer também dos homens livres pobres (conhecidos como caipiras) que também trabalhavam nas lavouras, só que temporariamente (derrubando a mata, limpando o terreno com queimadas, construindo senzalas etc). Além destes, há também aqueles que transportavam o café até os portos do Rio e de Santos em mulas (os famosos tropeiros) e os que enriqueceram vendendo produtos no decorrer dos seus caminhos (os vendeiros). É importante salientar que essa população também era alvo do poder dessa elite, através das velhas relações de compadrio, por serem importantes para o abastecimento das fazendas e para o transporte do café. A situação de penúria em que se encontravam fez com que criassem e abraçassem toda essa engrenagem da economia cafeeira.
A pobreza em grande parte era motivada pelo café, pois, todo tipo de atividade econômica alternativa ao café era duramente controlada e ás vezes desmobilizada pelos cafeicultores. O governo tentou em 1860 implantar o algodão no município de Taubaté como parte de um plano para diversificar a economia local e diminuir essa pobreza, no entanto, os fazendeiros foram decididamente contra e impediram a realização desse projeto.
Como podemos ver, toda uma “maquinaria” foi construída ao redor do café de modo a racionalizar e melhorar a sua produção e comercialização (desde o controle sobre os escravos até o controle sobre o governo, do caipira ao comissário de café) , em contraposição alguns aspectos primários não foram alterados como as técnicas de cultivo da terra e a pobreza local.
No entanto, e isso é bom lembrar, a produção do Vale paulista levou muito tempo para superar a do Vale fluminense, o pioneiro da região. Vassouras foi o maior centro cafeeiro até a década de 1850. Taubaté começou a se destacar na produção nas décadas de 1840 e 1850, chegando ao pódio na década de 1860. Depois disso a cafeicultura no Vale entrou em uma crise produtiva, enquanto no Oeste Paulista ou Planalto Paulista o café caminhava para seu apogeu.Para compensar a baixa produtividade os cafeicultores expandiam mais a área de plantio e contraiam mais empréstimos. No entanto, como o mercado oscilava muito, quase sempre eles ficavam com um grande estoque a mais ou menos. Essa instabilidade do mercado fez com que os fazendeiros recorressem ao Estado, entrando na política principalmente para proteger seus interesses, característica mais peculiar dessa nova classe, como bem salienta Celso Furtado.O governo imperial colaborou com isso ao tentar capturar o apoio dos fazendeiros seja com títulos de nobreza, a última coisa que faltava para regulamentar seu status (um bom exemplo é o grande fazendeiro José Francisco Monteiro que após ter enviado alguns de seus homens para a Guerra do Paraguai recebeu o título de Barão e posteriormente Visconde de Tremembé), ou com a nomeação de muitos deles para gabinetes, como é o caso de Antônio Moreira Barros, fazendeiro que se tornou Conselheiro do Império. Era interessante para o governo seu apoio visto que a formação do Império foi permeada de pequenas insurreições e revoltas regenciais (todo apoio é preciso, afinal) e, principalmente, pelo peso econômico que representavam.
Com o tempo, os fazendeiros ficaram hábeis nesse jogo político, apoiando certas campanhas do governo e, assim, obtendo dele certos recursos para os seus negócios. Foi assim que conseguiram que se construísse uma ferrovia no Vale para melhorar o transporte do café. Embora a empresa que construiu a Estrada de Ferro Central do Brasil fosse estrangeira, foi o governo que concedeu o contrato para a construção da ferrovia e determinou onde eles a construiriam, segundo os desígnios dos cafeicultores.
Não podemos nos esquecer ainda que a lavoura cafeeira se fundamentava no trabalho escravo, portanto, a baixa produtividade também era compensada com a compra e o tráfico, principalmente, de escravos. Com o tempo, as fazendas se tornaram extensíssimas e a população de escrava enorme. Para manter essa população sobre controle, uma vez que ela é fundamental, criaram-se certos dispositivos como o paternalismo e/ ou o autoritarismo.Não podemos nos esquecer também dos homens livres pobres (conhecidos como caipiras) que também trabalhavam nas lavouras, só que temporariamente (derrubando a mata, limpando o terreno com queimadas, construindo senzalas etc). Além destes, há também aqueles que transportavam o café até os portos do Rio e de Santos em mulas (os famosos tropeiros) e os que enriqueceram vendendo produtos no decorrer dos seus caminhos (os vendeiros). É importante salientar que essa população também era alvo do poder dessa elite, através das velhas relações de compadrio, por serem importantes para o abastecimento das fazendas e para o transporte do café. A situação de penúria em que se encontravam fez com que criassem e abraçassem toda essa engrenagem da economia cafeeira.
A pobreza em grande parte era motivada pelo café, pois, todo tipo de atividade econômica alternativa ao café era duramente controlada e ás vezes desmobilizada pelos cafeicultores. O governo tentou em 1860 implantar o algodão no município de Taubaté como parte de um plano para diversificar a economia local e diminuir essa pobreza, no entanto, os fazendeiros foram decididamente contra e impediram a realização desse projeto.
Como podemos ver, toda uma “maquinaria” foi construída ao redor do café de modo a racionalizar e melhorar a sua produção e comercialização (desde o controle sobre os escravos até o controle sobre o governo, do caipira ao comissário de café) , em contraposição alguns aspectos primários não foram alterados como as técnicas de cultivo da terra e a pobreza local.
Também é importante destacar isso: a oposição entre Oeste Paulista e o Vale como se fosse uma metáfora entre o moderno e o conservador. O Vale entrou em uma profunda crise produtiva por causa da conjunção de fatores conjunturais (infertilidade do solo, instabilidade do mercado internacional no final do século, erosão, Abolição, Proclamação da República) e estruturais (a agricultura rudimentar, a obstrução de novas atividades econômicas pela grande lavoura, a ocupação predatória do solo etc.), enquanto os cafeicultores do Oeste tiveram mais capacidade para se expandir e se adaptar.
No Brasil do Segundo Reinado não existe uma divisão bem nítida entre conservadores e liberais, até porque na prática eram todos liberais. Esse denominador comum foi atingido graças á política de conciliação do governo imperial, com medo de que as disputas políticas se radicalizarem colocando o país de novo no clima de revoltas do período regencial. O Vale se tornou alvo-maior dessa política principalmente pelo seu peso ecônomico e por ter sido palco justamente de uma Revolução Liberal em 1842 liderada pelo fazendeiro Joaquim Breves. O trauma de uma nova revolta fez com que o governo patrocinasse conciliações na região de modo a preservar as estruturas e os grupos de sempre.
Taubaté foi privilegiado foco desta ação do governo, não só porque durante a revolta de 1842 sua elite se manteve fiel ao governo, mas porque ela representava um dos maiores centros produtores locais. Uma amostra da "gratidão" do governo federal para com Taubaté é justamente ter elevado-a á cidade em 1842. Contudo, o conservadorismo também foi favorecido pela mentalidade escravocrata a qual via a imensa massa de escravos sempre com medo de insurreições, que se demonstraram concretas em 1842, nas decádas de 1860 e 1880, devido a intensidade da campanha abolicionista.
Os fazendeiros taubateanos, infiltrados no poder, tentam adiar a Abolição no nível federal, enquanto localmente promovem uma emancipação gradual, assim evitam um fluxo em massa de escravos livres, possíveis "distúrbios na paz" e ganham tempo até descobrirem uma nova alternativa. Alternativa essa que era o imigrante, seja ele açoriano ou italiano (este sempre visto com desconfiança pela população local graças aos relatos sobre o anarquismo nas capitais). O projeto dessa elite era construir colônias agrícolas particulares para que os imigrantes trabalhassem em terras pouco produtivas de modo a valorizar esses terrenos. Isso explica porque Quiririm, a maior colônia agrícola de Taubaté, se constituiu numa área cheia de brejos.
Mesmo com a crise produtiva, o café continuou sustentando Taubaté por um bom tempo. Os cafeicultores, em vista do contexto, diversificam seus investimentos, sendo acionistas e fundadores, inclusive de pequenas fábricas e indústrias. O Visconde de Tremembé, por exemplo, era fundador da Companhia de Gás e Óleos Minerais, responsável pela iluminação da cidade. Nessa época se sobressaem a pecuária e os gêneros alimentícios (principalmente o arroz e o feijão).
A cidade, que até então se constituia um apêndice do campo onde os desclassificados da lavoura (caipiras, viúvas, escravos libertos, comerciantes) residiam justamente por causa de sua condição, começa a sofrer um processo de adensamento com as imigrações e a Abolição. Um processo de urbanização, racionalizado como exigia a época, será imperioso. Esse processo será capitaneado, por isso mesmo, pela elite taubateana.
A elite taubateana era formada por diversos grupos sociais que por não obterem força suficiente para se sobressair um ao outro, viviam uma relação de simbiose. Temos, em primeiro lugar os cafeicultores, depois os comerciantes (há anos enriquecendo com a venda das mercadorias da região), os profissionais liberais (oriundos em boa parte da primeira classe abordada) e os quadros da Igreja Católica. Os cafeicultor tinha os recursos e os status, mas seu poder era limitado pelo poder de outro cafeicultor; os comerciantes tinham pouco recursos, mas não tinham status; os profissionais liberais tinham certo status, mas não os recursos suficientes; a Igreja aglutinava a população, mas não tinha muitos recursos.
Herdou-se da escravidão, o medo pela insurreição e a necessidade de controlar a população. Ou seja, as relações advindas da escravidão, tais quais o paternalismo e o autoritarismo, continuaram na cidade com a República. Essa necessidade de disciplinar o povo pode ser observada principalmente no Instituto de Lavoura e Comércio que alfabetiza e profissionalizava os moradores pertos de sua sede, o Convento Santa Clara.
As condições em Taubaté agora eram favoráveis á outra atividade econômica: a indústria têxtil. A cidade tinha uma boa infraestrutura, um grande contigente de mão-de-obra ociosa, proximidade com grandes centros urbanos e portos, facilidade de transporte ao ser cortada pela Central do Brasil e gente disposta a enriquecer com algo promissor. Félix Guisard, gerente de uma fábrica carioca, observou bem esses aspectos e decidiu abrir sua fábrica de tecidos aqui. Em 1891 ele funda a Companhia Taubaté Industrial (C.T.I). Percebe-se como a implantação da indústria na cidade foi mais uma vez fruto de uma conjunção de fatores locais e extra-locais: Fábio Ricci nos mostra como entre os seus acionistas e fundadores estavam, além da família Guisard, companhias locais e companhias inglesas. Ricci ainda nos mostra que o café ajudou ainda a financiar a industrialização do Vale: uns dos maiores acionistas eram cafeicultores.
(continua...)
Contudo, algumas dificuldades se impõem para os primeiros empreendedores: o cultivo demandava uma certa extensão de terras, isso sem falar das enormes despesas para a manutenção da lavoura. Mas soluções, ou melhor, arranjos foram criados. Quanto ás terras, podia-se tomá-las (uma vez que a legislação sobre terras devolutas no Vale era praticamente letra morta) ou comprá-las (grande colaboração a esses empreendedores foi a Lei de Terras de 1850 que permitia a posse de terra somente á aqueles que possuíssem determinada renda, restringindo assim o acesso a terra para setores mais populares).A maior dificuldade para a implantação do café no Vale veio do tempo relativamente longo (5 anos) que levava para se ter a primeira safra. A solução foi diversa: podia-se recorrer á empréstimos com parentes abastados (como mostra a pesquisa de Stanley Stein em Vassouras), bem como heranças e dotes, isso sem falar dos bancos, a maioria presente na Capital.O empréstimo, no entanto, quase nunca era totalmente pago, pois ele só aumentava no decorrer dos anos.
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