domingo, 15 de julho de 2012

Sobre aranhas e lagartos


Só passando aqui para comentar uma crítica do Cineplayers, do Heitor Romero sobre o Espetacular Homem Aranha, que achei muito interessante. O subtítulo revela muito do seu conteúdo: "A esperança de viver em um mundo livre de fraquezas".
Ele analisa o filme através de uma dualidade: Peter Parker e Curt Connors seriam pessoas muito próximas, com problemas muito parecidos, mas com fins diferentes. Parker é o loser, o adolescente desajustado. Um garoto definido pelo sumiço misterioso dos pais. Connors é um homem brilhante, mas que não consegue conviver com a perda de seu braço. Sua obsessão se espraia para a ciência.
A ciência aqui concede poderes aos dois, porém Peter aprende a usar o seu fardo para além dos seus traumas. Larga a vingança pessoal em nome da segurança da cidade. Deixa de ser inseguro para tomar as rédeas de sua vida. Connors não consegue conviver com a ideia de viver com uma deficiência, por isso almeja se transformar permanentemente no Lagarto. O bom doutor não supera seus problemas, ao contrário de Parker, ele os leva adiante, a um novo nível de megalomania.
Em certo momento a professora de literatura do colégio diz mais ou menos o seguinte: "conheci um homem que disse que existem dez tipos de enredos. Eu discordo. Existe só um: Quem sou eu?" O que isso quer dizer? É a saga do herói que depois de uma longa e tortuosa jornada tem como recompensa o auto-conhecimento. É a história de cada um de nós. Nós, seres humanos, tentando encontrar seu lugar no mundo e ao mesmo tempo tentando descobrir sua verdadeira força.
E aqui dá até pra usar o bom e velho Nietzsche: essa é a nossa ânsia de libertarmos das amarras que nos fazem medíocres para revelarmos todo nosso potencial, nos transformarmos em "super-homens"! Amarras que podem ser traumas, preconceitos, medos, limitações físicas, etc. A aspiração maior, essencial, do homem é a liberdade, mas ela só parece ser atingida plenamente quando sabemos exatamente o que podemos fazer com ela. Segundo essa fórmula, saber é poder.
No entanto, nem tudo é tão simples. Como humanos, temos a tendência a escorregar ás vezes na linha do equilíbrio. Liberdade total pode se tornar anarquia e a busca pela nossa força interior pode se transformar em perfeccionismo. Ora, lembremos de que o nazismo se utilizou do ideal de "super-homem" de Nietzsche com a maior facilidade, deturpando seu conteúdo original. A liberdade vai para o escanteio e a noção de superioridade entra em campo. O potencial do homem não é canalizado para seu próprio bem, mas para dominar o outro. Se Parker se aproxima do "super-homem" de Niezsche, o Lagarto está mais para o "super-homem" hitlerista.
Esse é um tema universal, mas particularmente interessante para o público adolescente que passa a conviver de maneira mais intensa essa tensão entre vontade e responsabilidades, entre identidade e alienação, dentre outras questões. Isso tudo já faz de Homem Aranha um mito pop sobre o amadurecimento.

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