sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Período Populista: alguns conceitos

No esquema de hoje vamos esclarecer alguns pontos:

ECONOMIA
Desde o fim dos anos 30, duas correntes econômicas passaram a dominar as políticas econômicas dos governos. A primeira defende que o Estado intervenha na economia protegendo os interesses nacionais. A segunda acredita que o Estado não deve interferir na economia, mas incentivar a entrada do capital estrangeiro no país. São conhecidas, respectivamente, como protecionismo e liberalismo.
Aos poucos foram ganhando outros apelidos: desenvolvimentismo e entreguismo.
Charge sobre o Plano de Metas de JK.
Vargas era o maior exemplo de governo protecionista. Grandes ações nesse sentido do seu segundo governo foram a criação da Petrobrás e a lei de remessa de lucros, que propunha que 1/3 dos lucros das empresas estrangeiras instaladas no Brasil fosse remetido ao estado nacional. Jango tinha um projeto parecido, mas não pode aplicá-lo como pretendia, pois estava mais preocupado em sanar a inflação que vinha atordoando o país.
Já o governo do Marechal Dutra adotou uma política mais "entreguista", pedindo ajuda econômica do FMI para financiar um projeto de incentivo á melhorias em várias esferas da vida pública nacional (como o transporte público, os postos de saúde, as escolas, etc.) Esse projeto ficou conhecido como SALTE e foi um grande fracasso: houve desvio de verbas e na prática a burocracia emperrou muitas das medidas previstas.
Um destaque especial vai para o governo de Juscelino Kubiscthek que adotou um misto dessas duas correntes em seu Plano de Metas. A idéia era desenvolver o país (50 anos em 5) através da união do capital privado (empresas brasileiras), estatal (empresas públicas nacionais) e estrangeiro (multinacionais e o FMI). Claro que as empresas privadas, principalmente de construção civil, foram privilegiadas pelo projeto de construção de Brasília e de rodovias pelo país inteiro. Mas a entrada de fábricas de produtos automobilísticos ganhou muitos incentivos fiscais e lucrou com uma mão-de-obra pouco especializada.
O detalhe é que o empréstimo pedido ao FMI aumentou a dívida externa, que já havia sido aumentada por Dutra e não foi resolvida por Vargas. É o começo de um processo de inflação que duraria quase 10 anos.
Por isso, a política econômica dos governos de Jânio e Jango é quase inexpressiva. O que eles tentavam fazer era basicamente acabar com essa crise. A inflação só é acalmada no governo militar, com os planos de Roberto Campos (um economista liberal).
O governo militar, de certa forma, imitou um pouco a política econômica de JK: fortaleceu as empresas estatais e protegeu os industriais nacionais, mas ao mesmo tempo incentivou a entrada de mais multinacionais no país e contraiu um empréstimo gigantesco com o FMI para patrocinar as obras faraônicas do governo Médici (a Transamazônica, por exemplo). O resultado foi uma nova inflação que se agravou com a crise do Petróleo em 1974. A dívida externa continuou fazendo o Brasil tremer. A inflação só foi controlada já nos anos 90 com o Plano Real.
Concluindo, do ponto de vista econômico o período populista foi um caos. Se formos pensar bem, de 1945 á 2000 o Brasil experimentou oscilações entre momentos críticos e momentos menos críticos na economia - a inflação foi o grande monstro, foi o que assustou e hoje continua a assustar, mas nem tanto, o brasileiro.
Um ponto interessante é a ideologia nacional-desenvolvimentista que surgiu a partir da década de 1950 e reuniu intelectuais dos mais diversos posicionamentos (desde pensadores liberais como Hélio Jaguaribe até o marxista ortodoxo Nelson Werneck Sodré). Tinha por objetivo entender o subdesenvolvimento brasileiro e propor alternativas para superá-lo, assim tornando o Brasil um país "avançado". A maioria destes pensadores se reuniram no Instituto de Estudos Brasileiros (ISEB), que teve uma vida relativamente curta.
Só para não fundirmos a cuca, vejamos abaixo os goveros e suas respectivas políticas economicas desse período:
Dutra (1946-1950) - SALTE
Vargas (1951-1954) - não há um projeto em específico
JK (1955-1959) - Plano de Metas
Jãnio Quadros (1961)
Parlamentarismo - Tancredo Neves, Hermes Lima e Brochado da Rocha (1961-1963)
Jango (1963-1964) - Planos Trienais

POLÍTICA
Os partidos políticos criados por Vargas, como vimos, foram dois instrumentos para angariar votos: um no povo e outro na elite. Vargas criou uma máquina para se sustentar no poder. Ao se apoiar em vários setores da sociedade para poder governa ele criou o que Boris Fausto chama de Estado de Compromisso: quase todos os grupos sociais estão ligados á ele. No seu primeiro governo ele já fazia isso, mas foi após 1945 que essa política se reforçou, pois a democracia exigia novos métodos.
Charge: o encontro entre Brizola, Vargas e Jango.
Já comentamos aqui que a sombra de Vargas parece pairar em todo esse período. O motivo é simples: ele criou essa máquina eleitoral. PTB e PSD eram os maiores partidos nacionais: um tinha amplo apoio popular e outro apoio dos "donos do poder". A UDN tentava quebrar essa lógica por meio de fortes ataques á estes partidos, mas perceberam que sua força era muito grande, por isso procuraram seus própios aliados e os encontraram no meio das Forças Armadas, onde o nacionalismo se unia lentamente ao anti-comunismo.
A UDN conseguiu quebrar essa lógica e de forma democrática em 1960 com a eleição de Jânio Quadros, um político paulista que tinha a simpatia popular e não simpatizava com o trabalhismo. Essa foi a primeira vez que um presidente do partido da oposição ganhou as eleições com milhões de votos.
A posse de Jango foi fruto do sistema de voto desvinculado, uma herança da República Velha. Jango era popular, sua pessoa era muito ligada á imagem de Vargas. No entanto, tanto a esquerda como a direita não gostavam dele. Isso porque Jango era um estancieiro gaúcho que tinha aprendido com Vargas a arte de manipular interesses. Jango se apoiava em todos os grupos sociais que lhe aparecesse não só porque temia ser deposto, mas porque queria implantar um Estado de Compromisso. Uma ditadura? Creio que não. As mudanças que Jango pretendia fazer na Constituição diziam respeito á reeleição e a questão de nenhum parente do presidente poder se candidatar ao cargo (afinal, Leonel Brizola poderia ser um ótimo herdeiro político seu, embora fosse seu cunhado).
Boa parte da esquerda brasileira conseguia ver as estratégias políticas de Jango para continuar com seu projeto político, por isso desconfiavam de suas atitudes. Todos sabiam que ele não era comunista. Prestes tinha total consciência disso, mas decidiu apoiá-lo para acatar aquele projeto de revolução por etapas (primeiro a burguesa e depois a comunista) que o stalinismo tinha difundido pelos PCs pelo mundo.
As medidas de Jango (as discussões sobre as reformas de base, principalmente) eram um meio de conquistar mais apoio, por isso se acentuaram em momentos em que parecia que a UDN estava a um passo de conseguir sua renúncia. A reforma agrária proposta po Jango não era total, mas seletiva. Ela buscava contornar o problema central, o poder do latifúndio, assim como o fez o INCRA no regime militar: enquanto o projeto da ditadura de reforma agrária consistia em mandar lavradores para se ocupar regiões da Amazônia, o projeto de Jango pretendia começar distribuindo terras devolutas (como as no entorno das rodovias) á alguns camponeses.
A força de Vargas estava nos grandes centros urbanos, entre os trabalhadores e a classe média. O campo durante boa parte de seus governos manteve-se inalterado. O motivo pode ser encontrado no grande número de latifundiários que integravam os quadros do PSD e do PTB (ora, o próprio Vargas e Jango eram estancieiros). A reforma agrária foi adiada também no governo de JK, cujo alvo principal de sua política de industrialização se encontrou nas grandes cidades do Sudeste do país, como São Paulo. Jango recorreu á reforma agrária como instrumento político, mas já era tarde.
O populismo é um meio de manipular as massas, esse novo personagem que passa a ter cada vez mais poder com o fim do século XIX. Na República Velha, o povo ficava bem longe do aparato político, por isso muitos a chamam de República das Oligarquias. Com Vargas, as massas passam a ter mais poder, mas um poder limitado pelo controle do Estado. Não é a toa que os estádios de futebol ficavam cheios diante de algums discurso de Vargas no dia do trabalho. De 1945 em diante, as massas continuam sendo manipuladas, vez ou outra representadas, mas majoritamente manipuladas.
Interessante é enxergamos como esse foi um período tenso, onde experimentamos um sopro de democracia constantemente ameaçado com golpes e revoltas. É um período expremido entre duas ditaduras.

CULTURA
Este período é encarado como um dos mais efervescentes culturalmente. Existe aqui um aprofundamento das propostas modernistas de criar uma arte autenticamente brasileiras, principalmente na música. Os anos 50 são tidos como os "anos Bossa Nova", momento em que este estilo musical, surgido da reunião do samba com gêneros musicais norte-americanos como o jazz, aparece nos discos de João Gilberto e nas letras de Vinícius de Moraes e Tom Jobim. O samba, até então marginalizado pela sua origem social (era feito em sua maioria pelo pessoal dos morros, das favelas), era reinventado e valorizado.
Esse interesse pelo samba reflete uma tendência presente na maioria dos intelectuais brasileiros: um interesse suscitado tanto pelo flerte com os movimentos de esquerda como pelo namoro com as propostas modernistas. Nos anos 60, tenta-se recuperar uma cultura popular, em contraposição á cultura erudita, marca da burguesia. É nessa conturbada década que surge a iniciativa dos Centros Popular de Cultura (CPC). Em parte, iniciativa do movimento estudantil e de líderes da esquerda brasileira.

O ator Oduvaldo Vianna Filho, um dos maiores membros dos CPCs.
No entanto, buscava-se não preservar a cultura popular, mas transformá-la em um instrumento político para atingir o povo e conclamá-lo á luta. Muitos dos entusiastas dos CPCs, como Ferreira Gullar, anos depois reconheceriam que apesar da proposta revolucionária, adotaram uma política autoritária ao descartarem tudo aquilo que não parecesse engajado.
O jornalista amazonense Narciso Lobo lembra que nesses anos cultura e política eram categorias quase intrínsecas. Podemos estender essa afirmação á todo o período populista, uma vez que a política adquiriu um status importante em nosso país através das lutas entre o trabalhismo e seus detratores, com uma pequena ressalva: claro que nos anos 60 tudo se acirra, se radicaliza mais. Afinal, basta nos lembrarmos do papel do Festival Folclórico de Manaus, de como esse evento foi palco de manifestações culturais e de articulações políticas.

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