quinta-feira, 17 de maio de 2012

Leopold e os muitos Rankes


Leopold von Ranke (1795-1886) é um dos clássicos da Historiografia. É chamado de Pai da História Científica e isso já é o bastante para muitos o classificarem como positivista. Mas precisamos tomar cuidado ao taxar qualquer um de positivista.
Sabe o que é ser positivista em se tratando de História? Não é apenas coletar e enumerar fatos, mas usar esses fatos para criar leis gerais do funcionamento da História. O Positivismo tirou esse método, o de encontrar leis gerais, das Ciências Naturais e incorporou á História.
Ranke não cria leis gerais, pelo contrário, reafirma a singularidade dos fatos históricos. Para ele todo acontecimento histórico é único e a função do historiador é encontrar os motivos de seu surgimento. Nesse ponto ele se aproxima do Historicismo.
O Historicismo, ou Historismo para Sérgio Buarque de Holanda, é uma corrente historiográfica que surgiu no século XIX em oposição ao Positivismo. Defendia que a História não tem sentido, todo acontecimento histórico é singular e é produzido por uma série de processos anteriores a ele. Para os historicistas tudo é histórico, até o próprio conhecimento da História. Já os positivistas acreditam que o conhecimento, desde que seja objetivo e imparcial, é universal e atemporal.

Ranke defende a singularidade dos fatos históricos e vai buscar ela nas causas desse acontecimento. Mas ele também defende que devemos "narrar tal como aconteceu". Sérgio Buarque de Holanda diz que essa frase foi mal interpretada: ao dizer isso, Ranke estaria querendo afirmar o caráter científico da História e não estaria defendendo o Positivismo. Acontece que naquele tempo o ideal de ciência era positivista. Ainda se pensava que a imparcialidade e a objetividade eram possíveis.
Por isso Ranke, mesmo sendo prussiano e luterano, não manifesta em seus escritos os seus pendores cívicos ou a sua devoção religiosa como faziam outros historiadores. Ele buscava explicar os fatos e julgá-los o mínimo possível. Para ele, avaliar os acontecimentos históricos era desconsiderar o contexto em que ele foi produzido e renegar a cientificidade da História. Deixem os julgamentos para os filósofos ou para os escritores, diria ele.
O historiador alemão Peter Gay diz que essa defesa da História como ciência não faz de Ranke um anti-artista.  O modo como ele apresentava seu tema, como escrevia sobre os processos históricos, se assemelha á um romance histórico. Os personagens são apresentados, o cenário é descrito, a ação é narrada. Depois de todo esse drama vem a tese ao invés da lição de moral. Portanto para Peter, Ranke é um cientista e um dramaturgo.

Além do fato de ser profundamente religioso. Dizíamos que ele buscava expressar ao mínimo a sua convicção religiosa em seus escritos, mas é inevitável que em alguns momentos isso fique explícito. Ranke não menciona em seus trabalhos históricos sua opinião política e religiosa, mas ele participou da redação de uma revista na Prússia onde clamava abertamente pela unificação alemã, seja pelas mãos do imperador ou de Deus, quiçá de ambos. A escolha do tema revela um pouco da personalidade de Ranke: seus principais temas foi a construção do povo alemão e o nascimento da religião protestante.
A divisão entre o Ranke pessoal e o Ranke historiador, feita pelo próprio, se manifesta tanto nos seus ideais políticos (se nas suas teses ele vê a História como um processo sem sentido, como queriam os historicistas, nos seus panfletos ele defende a marcha ao progresso) quanto na escolha de seus temas. Além disso é preciso lembrar que Ranke era um funcionário do governo prussiano: foi nomeado Historiador Real e condecorado até com o título de barão.
Enfim, há muito mais em Ranke do que se diz haver.

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