sexta-feira, 27 de maio de 2011

Uma liderança política cabocla

Álvaro Maia
O título pegamos emprestado de Eloína Monteiro dos Santos. Segundo ela, Álvaro Maia poderia ser definido como uma liderança política cabocla. Mas quem é Álvaro Maia?
Filho de um cearense com uma amazonense, Álvaro Botelho Maia nasceu no seringal Goiabal no interior do Amazonas em 1893, época do auge da produção gomífera. Seus pais se mudaram para a capital e lá ele cursou o ensino secundário no prestigiado Ginásio Amazonense D. Pedro II. Se formou em Direito pela Faculdade de Direito do Recife e retornou ao Amazonas um ano depois. Maia gostava muito de escrever, principalmente poemas. Inspirado pelo parnasianismo, escreveu muitos sonetos sobre a vida amazônica.
Alguns anos depois da Revolta Tenentista de 1924 em Manaus conseguiu um emprego na prefeitura como secretário e posteriormente como secretário de Educação e Cultura. Entre os saraus e as reuniões burocráticas, Álvaro Maia passou a ser tornar cada vez mais reconhecido em Manaus como um homem talentoso e carismático. O auge desse reconhecimento viria em 1930, quando Getúlio Vargas o indicou como interventor federal no Amazonas. Apontado por muitos jornalistas, como Assis Chateaubriand, como um homem carismático e patriótico, Getúlio Vargas não tardou em nomeá-lo. Seu mandato foi breve, terminou em 1933, mas retornou ao governo do Estado em 1937, permanecendo dessa vez até a queda de Vargas do poder em 1945.
Álvaro Maia se tornou símbolo não só do Estado Novo, mas da elite amazonense. Em 1923, nas comemorações da adesão do Amazonas á indepedência do Brasil, o jovem Álvaro Maia recitou um poema que tinha composto no palco do Teatro Amazonas. Chamava-se Canção de Fé e Esperança. Fé no Amazonas, que tinha já presenteado o Brasil com muitos heróis e alcançado um progresso considerável com a borracha. Esperança de poder reerguer esse seu status mais uma vez, já que na época em questão (década de 1920) a borracha se encontrava em retração graças ao surgimento das plantações de seringueira na Ásia. Caberia aos jovens essa ação de reerguer a honra do estado. Eles deveriam fazer isso inspirados pelo patriotismo e pela tradição local.

Buzina dos Paranás, 1958.
Álvaro Maia tornou-se conhecido por iniciar um movimento cultural e político chamado por ele de "glebarismo". Glebarismo, a defesa da gleba, é nada mais que o regionalismo, a valorização de sua região. Por isso em seus livros dedicou-se a retratar a vida do amazonense, como o fez em Beiradão e Buzina dos Paranás. Álvaro Maia elege como o verdadeiro representante da cultura amazonense o caboclo, a união do colonizador (português) e colonizado (indígena).

Cartão postal de Manaus, 1910.
Curiosamente, o ponto alto da cultura amazonense era tido como a Belle Epoque manauara, justamente um período em que a sociedade local se sujeitou á valores culturais europeus. O historiador Marco Aurélio Paiva, investigando o cinema de Silvino Santos, cria a tese de que a maior característica do intelectual amazonense nas décadas seguintes ao fim da Belle Epoque era demonstrar ao resto do mundo que o Amazonas, embora se encontrasse meio "estagnado", era uma região que alcançou progressos memoráveis, sendo o maior deles o domínio sobre a natureza amazônica. Lademe Corrêia Sousa acredita que esse Amazonas criado por esses intelectuais, sendo Álvaro Maia um dos principais deles, era não só uma forma de propaganda, mas uma maneira de pedir ao governo central que os ajudasse. Seria uma obrigação cívica do Estado ajudar a recuperar o auge do progresso amazonense, a Belle Epoque.
O objetivo maior da política de Álvaro Maia foi justamente esse, de voltar aos "tempos dourados" do boom da borracha. Tanto é que medidas relacionadas á outro tipo de atividade, como a indústria foram adiadas, uma vez que a elite local ainda tinha esperança de que a borracha voltasse a ser o motor da economia amazonense. Maia acaba se frustrando, pois o governo varguista não comprou sua idéia. Apesar de em discurso pronunciado em Manaus alguns anos depois do golpe de 1937 em que defendia a volta da economia gomífera, Vargas não estava interessado em  fortalecer o extrativismo. Sua preocupação maior era a industrialização e o Sudeste.

Assim, em 1942, com a Campanha da Borracha para Vitória, Álvaro Maia e boa parte da elite amazonense vêem uma chance de se reerguer com os Acordos de Washignton. No entanto, a campanha organizada pelo Estados Unidos e que contava com o apoio de Vargas era algo, desde o início, êfemero; duraria só o tempo em que as plantações de seringueira da Ásia estivesse sob o domínio dos japoneses. Em 1945, com o fim da guerra, a campanha também se acaba, bem como a esperança da elite amazonense.

Plínio Coelho
Álvaro Maia continuou sendo uma figura importante na política e literatura amazonense após o fim da Era Vargas. Mesmo não ocupando mais o cargo de governador, sua figura ainda era hegemônica na cidade. Os primeiros abalos á sua imagem virão com o surgimento de lideranças trabalhistas como Plínio Coelho e Gilberto Mestrinho no começo dos anos 50. Pelo seu apelo popular e seu ideal desenvolvimentista, essas lideranças vão pouco a pouco adquirindo prestígio na capital e as eleições passam a ser vistas como uma luta entre o "novo" e o "velho", sendo este último representado pelo estado-novismo de Maia que viera a falecer em 1969, enquanto ainda exercia o cargo de senador.
Uma das teses de Eloína Monteiro dos Santos é de que Álvaro Maia não conseguiu efetivar seu projeto político de ressuscitar a Belle Epoque (embora tenha feito algumas medidas urbanísticas que seguem essa linha) o que o fez se refugir na literatura. Seu sonho se materializou somente na literatura. Maia continuou escrevendo sobre o homem amazonense, mas imprimindo em seus livros agora esse sonho de voltar á essa época ideal que foi a Belle Epoque. O que orientava sua vida política e literária, portanto, era essa valorização da cultura amazonense e uma tentativa de reerguer o momento em que ela atingiu o seu auge, na sua visão.

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