quarta-feira, 6 de abril de 2011

A Música na América Espanhola Colonial

Essa é uma pequena resenha que fiz sobre um artigo sobre música na América Latina colonial:
LP do maestro argentino Ariel Ramírez sobre a Misa Criolla, que reatualiza a música barroca e andina.


STEVENSON, Robert. A Música na América Espanhola Colonial. In: BETHELL, Leslie (org.) História da América Latina. vol. II. São Paulo/ Brasília, DF: Editora da universidade de São Paulo/ Fundação Alexandre Gusmão, 2004.

No texto em questão o autor, musicologista e professor de música na Universidade da Califórnia, abordará um tema pouco conhecido: a música produzida na América Latina, com exceção do Brasil, durante o período colonial. Tentaremos analisar aqui as suas considerações, deixando de lado um pouco seus termos técnicos musicais.
Stevenson, logo de início, nos adianta que a música latino-americana colonial era composta pela música barroca européia, a nativa (dos povos pré-colombianos), a africana e a junção destas três. Já na década de 1550 podemos encontrar essa diversidade musical na Cidade do México com canções de cunho asteca, mas voltadas para a evangelização dos nativos. O autor fala de muitas publicações de músicas sacra com fundo barroco e asteca no México, a maioria patrocinada por missionários. A difusão era tanta que a própria Igreja, no Primeiro Concílio da Igreja Mexicana, baixou um decreto para controlar a sua produção.

Essa miscigenação musical tornou-se costumeira, assim como a figura do maestro de capilla, o religioso encarregado do acompanhamento musical da paróquia, seja através das missas, das festas religiosas ou dos sermões. Os maiores compositores desse período foram Hernando Franco e Gutierre Fernandez Hidalgo, todos vindos da Península Ibérica. Mas havia também compositores mestiços como Gonzalo García Zorro e Diego Lobato de Sosa, sendo o primeiro da Colômbia e o segundo do Peru. Outros, inclusive, não tiveram sucesso em sua carreira, apesar de serem muito talentosos, pela sua condição “racial”: Stevenson nos fala do caso de Juan Matias que por ser índio não conseguiu obter tanto sucesso como seus companheiros mestiços.

No final da década de 1590, há reclamações na Cidade do México da “indecente” música dos negros. Apesar disso, Stevenson nos mostra que muitos padres protegiam os coros de negros. Há casos ainda de maestros, na América do Sul, de associarem em suas composições elementos da música negra, podendo ser encontradas estas composições nas bibliotecas dos seminários tanto do Peru como da Colômbia.

Enquanto na Cidade do México o cargo de maestro de capilla torna-se tradicional e há até casos de salários exorbitantes, com o novo século La Plata, na América do Sul, torna-se, graças ao maestro Juan de Araújo, um grande centro musical. Potosí também e graças ao maestro Antonio Duran de La Mota, que era por sua vez ibérico. Nesse período, o século XVII e o século XVIII, começa a prevalecer no cenário musical compositores vindos de fora da América. A Catedral de Lima, por exemplo, tinha chamado um cantor italiano. Aliás, era costume na Espanha “importar” cantores de outros países.

No México, os músicos locais continuaram a ser incentivados. Manuel de Zumaya, considerado um dos maiores compositores coloniais, por exemplo, era mexicano e mestiço. Mas assim que ele saiu a Catedral da Cidade do México contratou, por quase todo o século XVIII, muitos músicos internacionais. Na mesma época, na Venezuela, podemos ver um grupo de mulatos que se reuniram ao redor de um padre oratoriano produzir inúmeras obras, contudo, com poucos elementos da cultura africana agora. Nas Antilhas, destaca-se a presença do compositor Joseph Boulogne que foi tão valorizado na Europa que emigrou para a França em 1752.

O autor chama a atenção para o repertório colonial venezuelano, pois durante boa parte de sua existência era valorizado e até se comprometeu com a causa nacional. Muitas canções foram usadas pelos seguidores de Simon Bolívar e continuam sendo cantadas até hoje. Retirando o caso da Venezuela, é curioso percebermos como durante um período em que estava se lutando pela independência política e a construção de uma cultura nacional os músicos e compositores locais foram tão pouco valorizados.

O texto é muito denso, por estar cheio de informações e por utilizar muitos termos e expressões próprios da música, no entanto, ele é muito proveitoso por nos mostrar como a musical colonial na América Espanhola era, de início, cheia de uma diversidade cultural, que refletia o processo de colonização, e um vínculo muito grande com a religiosidade. Interessante também é a tese do autor de que com a aproximação das independências latino-americanas essa diversidade vai perdendo espaço para a música européia, com a difusão de músicos internacionais na região.

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