domingo, 20 de março de 2011

As amazonas do Amazonas

Frei Gaspar de Carvajal foi o responsável por inaugurar o imaginário amazônico. Foi com seu relato da viagem (1541-1542) do espanhol Francisco de Orellana, saindo do Peru e descendo o rio até chegar ao Oceano Atlântico, que o mundo europeu recebeu as primeiras notícias sobre esse mundo maravilhoso.
Uma floresta imensa e enigmática, animais monstruosos e povos de todos os tipos de personalidade e tamanhos. Mas o mais impressionante de seu relato, com certeza, foi ter encontrado no meio do Novo Mundo o reino das poderosas guerreiras relatadas na mitologia grega: as amazonas.
Depois de meses de viagem, Orellana é encurralado no rio por várias canoas apinhadas de mulheres guerreiras e alguns homens. Flechas voam contra os barcos, acertando inclusive nosso cronista que morreria caolho.
A batalha é maciça. Depois de algumas horas, as canoas somem e as flechas param de serem atiradas. Metade da tripulação é morta. Alguns índios são feitos prisioneiros. Estes contam que são súditos das amazonas, assim como a maioria dos povos da região, e que elas possuem uma aldeia no interior da floresta cercada e composta por um imenso templo de pedra, guardado por dois felinos feitos de pedra.
O relato chegou á Espanha e deixou á todos de queixos caídos. Anos depois, seguindo a expedição do português Pedro Teixeira, o padre Cristóbal de Acuña (1638-1639) faz o mesmo trajeto e ainda procura pelas míticas amazonas. Walter Rayleigh (1617), corsário inglês, viajará ao Orinoco á procura de seu reino e até o cientista francês La Condamineau (1743-1744) se perguntará onde estão as mulheres guerreiras, assim como seu colega cientista Alexander Von Humboldt (1799-1804).
É possível que elas existiram? Se sim, o que aconteceu com elas? Muitos se dedicaram á responde essa questão. Alguns encontram na tradição tupi, as amazonas na forma das icamiabas, mulheres que não concordaram com as leis propostas pelo herói-reformador Jurupari para sujeitar á mulher ao homem.
Em muitas etnias amazônicas, a mulher tem um papel importante, substituindo o homem em certas funções como a caça e a pesca. No entanto, notícias sobre uma tribo feito somente por mulheres guerreiras ficaram restritas ao período colonial. Pesquisadores encontraram outro nome para elas: Icamiabas ou "mulheres sem maridos". Icamiaba também era o nome de um morro no Equador, mas verificou-se que ali não habitavam mulheres guerreiras.
Terá Carvajal inventado tudo isso? Essa é outra hipótese. No relato do frade aparecem menções á gigantes, assim como nos relatos posteriores também surgiram as figuras de monstros acéfalos, dragões, sereias, etc. O historiador Auxiliomar Ugarte trabalha com a hipótese de que a consciência do fabuloso e a perspectiva de explorar algo totalmente novo tenha confundido e muito seus primeiros exploradores.
Afinal, estamos falando de homens que ainda conviviam com um imaginário medieval, um imaginário fantástico. Carvajal interpreta esse novo mundo segundo o referencial de sua cultura. O historiador Antônio Porro acredita que Carvajal tenha confundido um povo, os Conduris, com as mulheres guerreiras, por causa de suas feições físicas e da região que então habitavam.

As amazonas são parte, uma das mais importantes, do imaginário construído sobre a região. Um imaginário que enxerga nessa região tão enigmática e desafiadora ora o paraíso ora o inferno. Um imaginário que se modifica com os séculos, mas que mantém um certo traço essencial: a de uma natureza exuberante convivendo com um povo "selvagem" ou "inferior".

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