Arthur Cézar Ferreira Reis em seu livro A Amazônia e a Cobiça Internacional (1968) nos relata um episódio curioso: o interesse da Inglaterra pelo Pará nos tempos da Cabanagem.
A revolta que explodiu no Pará e no Amazonas durante a Regência durou cinco anos. Em 7 de janeiro de 1835, os cabanos tomam o poder em Belém, tendo os irmãos Vinagre á frente do governo. A cidade foi recapturada pelas forças legalistas, mas em 14 de agosto do mesmo ano cai de novo nas mãos dos cabano, sendo escolhido para governá-la o jovem cearense Eduardo Angelim.
Eduardo Angelim |
Pois bem, durante o governo de Angelim o clima de instabilidade ainda era grande. Um navio inglês chamado Clio, fundeado em Salinas, trazendo armas para o Comandante Lobo de Souza, o líder das forças legalistas, teve sua tripulação morta e seu carregamento roubado. Acredita-se que o comandante do navio, á procura de um prático, tenha escolhido para o cargo um norte-americano que já vivia aqui, John Priest. Ao saber do conteúdo do navio ele teria contado aos seus amigos e planejado o saque.
Belém do Pará em desenho de Spiux. |
Por causa da instabilidade, não foi possível achar Priest e seus cúmplices. No dia 17 de março de 1836 chegam á Baía de Guajará três belonaves inglesas comandadas pelo Capitão B. Strong. Este manda um ofício á Angelim pedindo que os criminosos sejam punidos, que a Inglaterra seja indenizada pelo seu governo e que, em sinal de luto á tripulação morta, a bandeira britânica seja içada acima da brasileira.
Angelim, assim que traduziu o ofício se reuniu com seus conselheiros e escreveu a sua resposta. No ofício mandado á Strong, Angelim diz que por causa da desordem reinante na província eles ainda não acharam os responsáveis, mas assim que tudo se acalmar os acharia e os puniria. Quanto á indenização, o governo do Brasil que deve arcar com ela, visto que o Pará pertence á ele. Sobre a bandeira, isso será feito.
Até aqui a história está mais para um desentendimento internacional que alguma forma de conspiração imperialista estrangeira. É quando Angelim convida os oficiais ingleses para um almoço que a história muda de rumo. Segundo Domingos Rayol que chegou a entrevistar Angelim para escrever seu livro sobre a Cabanagem, Motins Políticos, em determinada hora um oficial britânico deu a idéia: o Pará poderia se declarar independente e a Inglaterra o reconheceria como país. Angelim descarta a sugestão, dizendo que prefere continuar brasileiro.
Quando as forças legalistas depõem o governo cabano, Angelim alega que fez tudo pelo Brasil e que podia ter facilmente cedido ás sugestões separatistas que lhe foram feitas por estrangeiros mais de uma vez. Arthur Reis se pergunta quem seriam esses estrangeiros. Diplomatas? Militares? Viajantes?
A Inglaterra, que até então mantinha ótimas relações com o Império brasileiro, não hesitou em aproveitar a oportunidade de poder se tornar credora de mais um país quando percebeu que as províncias do Norte estavam insatisfeitas com o governo e tinham alguns pensamentos separatistas. Percebam: o navio saqueado chegou á região justamente para ajudar as forças legalistas, no entanto os oficiais que chegaram depois para cobrar justiça acabam por se aliar ao governo dos revoltosos, inclusive dando "sugestões" muito convenientes (para os britânicos, claro).
Esse capítulo, assim como todo o livro de Arthur Reis demonstram que o interesse pela Amazônia já é antigo e se manifesta das mais diferentes formas. Se antes se pretendia ocupar militarmente a região, depois pretende dominá-la diplomaticamente e, como acontece muito hoje, financeiramente.
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